Venda de pescados cai 95% em Valadares por temor de contaminação

Ana Lúcia Gonçalves - Hoje em Dia
28/02/2016 às 09:03.
Atualizado em 16/11/2021 às 01:36

A contaminação do rio Doce pelo rejeito que vazou da barragem da Samarco, em Mariana, na região Central de Minas, em 5 de novembro, também causa prejuízos aos feirantes e donos de peixarias. Em Governador Valadares, a venda do Mercado Central caiu 95% na Quaresma, período de grande consumo de pescado.

O comerciante Pedro Martins, de 52 anos, destaca que na abertura da piracema, em 1º de novembro, a pesca fica proibida e as peixarias ficam obrigadas a comercializar apenas o estoque declarado até aquela data ao Instituto Estadual de Florestas (IEF).

O difícil, segundo ele, está sendo convencer os consumidores disso. “A primeira coisa que perguntam é se o peixe é do rio Doce”. Mesmo com a explicação de que o pescado foi retirado antes da passagem da lama, muitos consumidores preferem não levar. “Não acreditam, mas eu comecei a estocar em agosto do ano passado”, afirma Martins.

Segundo ele, sem conseguir vender, está tendo que jogar peixe fora todos os dias. “Perdi a conta do que já descartei, porque estragou. Minhas vendas caíram 95%”, lamenta.

Questionado se a saída não seria fazer promoções para atrair a clientela, o comerciante foi enfático: “Promoção para quem? Os corredores do mercado estão vazios”. Martins lembra que a peixaria foi aberta há 20 anos para vender peixes do rio Doce.

Demissões

O comerciante Jacó Alves Batista, de 38 anos, também reclama. Desde que a lama proveniente de Fundão desceu o rio Doce, ele precisou demitir dois funcionários da peixaria.

Nos anos anteriores, contratações eram necessárias nesta época do ano. Agora, Batista passa quase todo o tempo à espera de clientes. “Na Quaresma, não tínhamos tempo nem de sentar. Vendíamos de 12 a 13 toneladas nos 40 dias, mas este ano não vamos vender nem 20% desse total”, avalia.

Para evitar mais prejuízos, ele vendeu todo o estoque de peixes capturados no rio Doce antes da passagem da lama para peixarias do Rio de Janeiro. Além disso, passou a comprar o pescado em Manaus. “Não adiantou. O cliente não confia. Ele chega, olha, pergunta preço e origem e vai embora sem levar nada, achando que o peixe é do rio Doce”.

Monitoramento

Sobre a contaminação dos peixes do rio Doce, a Samarco informa que faz o monitoramento diário da qualidade da água a pedido do Ministério Público Estadual (MPE). “Todos os parâmetros estão dentro do limite legal estabelecido no Brasil para os metais pesados e os laudos são disponibilizados para as autoridades”, afirma a mineradora.

O trabalho, segundo a empresa, é feito por uma equipe formada por 350 pessoas em 170 pontos ao longo do rio Doce, de Minas ao Espírito Santo. Em três meses, mais de 150 mil análises já foram feitas.

Um estudo sobre o acúmulo de metais nos peixes está em andamento, destaca a Samarco.

Sobre o repovoamento do rio Doce, a mineradora diz que “todos os trabalhos relativos ao manancial estão em andamento”.A Samarco informou que faz o monitoramento diário da qualidade do rio Doce: “parâmetros estão dentro do limite legal para os metais pesados”, garante.

'Não dá para confiar na procedência do pescado’

A tradição de comer peixes todas as quartas e sextas-feiras durante a Quaresma está sendo quebrada neste ano pela empresária Durvalina Soares Silva, de 53 anos, de Governador Valadares. Desde que a lama da barragem da Samarco contaminou o rio Doce, ela substituiu o pescado por ovos e sardinhas em conserva enlatadas antes de 5 de novembro de 2015, quando houve a ruptura da represa em Mariana.

“Sou apaixonada por peixe, mas não dá para confiar. Se é do rio Doce e foi congelado antes, não está fresco. Se for de agora, quem garante a procedência? Pode estar contaminado. Prefiro passar longe das peixarias”, diz.

Grávida de nove meses, a comerciária Ivete Silva, de 37 anos, vai manter a tradição comprando bacalhau, mas apenas para um único dia, a Sexta-feira da Paixão. “É muito caro e não dá para esbanjar.

“Também não confio nos peixes que estão a venda por ai”, afirma a camelô Miriam Santos Souza.

Diferença

A servidora pública Milene Cimini, de 32 anos, não quer abrir mão do pescado na Quaresma. Mas ele teme ser enganada pelos comerciantes.“Não consigo diferenciar o peixe capturado no rio Doce do que é fisgado no mar ou vem de outras bandas, e o jeito será confiar no peixeiro. Certo é que peixe fresco, pescado por aqui, não vamos ter tão cedo”, lamenta.

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