Presidente da Fiemg: 'Estado mamãe não existe'

Luciana Sampaio Moreira
lsampaio@hojeemdia.com.br
11/10/2018 às 22:22.
Atualizado em 10/11/2021 às 02:56
 (Flávio Tavares)

(Flávio Tavares)

A posse do atual presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Flávio Roscoe Nogueira, 47 anos, durante a greve dos caminhoneiros, no final de maio, foi apenas o “batismo de fogo” do industrial do ramo têxtil que assumiu a entidade em um momento de grandes desafios institucionais e da conjuntura econômica. 

Com um estilo próprio de liderança, o dirigente tem uma visão diferente de representatividade, na qual o que está em jogo são os interesses do setor que ele representa. Também acredita que a conduta apolítica adotada pela entidade neste momento é o que vai garantir a devida autonomia para a sua atuação nos próximos anos. 

“Não estou preocupado com o que governador ou presidente da República estão pensando. Estou aqui para defender a indústria. Quando fizerem certo, baterei palmas. Quando fizerem errado, vou criticar e tomar as medidas cabíveis. Esse é o processo natural da democracia. Para ser aliado não tem que concordar 100% das vezes”, adianta.
Nesta entrevista, ele fala sobre o mercado, e-social e também sobre perspectivas de futuro para Minas e para o país. Flávio Tavares 

 Como o senhor avalia o seu início de mandato?
Assumi a Fiemg ‘no olho do furacão’ da greve dos caminhoneiros. Mas a situação não está menos desafiadora agora. Adotamos uma postura mais próxima da nossa base que são os sindicatos patronais e temos promovido reuniões para saber quais são as reivindicações de cada segmento. Internamente, conduzimos um processo de reestruturação com 150 medidas que incluíram redução do nível hierárquico, otimização de processos e serviços, corte de pessoal e revisão de contratos. Apenas na Fiemg, reduzimos o quadro em 22% e a nossa meta para 2019 é ter um custo operacional entre 25% e 30% menor que o deste ano. Enquanto isso, a entidade está ocupando o seu espaço de forma efetiva. Antes, as coisas se resolviam dentro de gabinetes, em reuniões fechadas. Mas hoje não é mais assim. O posicionamento da Fiemg sobre os temas de interesse da indústria é uma resposta aos anseios dos associados.


Houve avanços nesses quatro meses de gestão?
Acho que a nossa proposta de trabalho tem dado resultados nas diversas frentes de atuação. Acredito que os sindicatos sentiam falta de ver essa atuação mais efetiva da Fiemg nas questões de interesse da indústria. Temos obtido, por isso, alguns êxitos em um momento onde nada se resolve, devido às indefinições que marcam o período eleitoral. Um deles é a alteração do cronograma do e-social, publicada no Diário Oficial de 5 de outubro. Essa prorrogação é uma conquista tímida porque nosso objetivo é acabar com o e-social. Temos trabalhado fortemente para que o sistema não seja implementado, mesmo sabendo que as chances de êxito são pequenas. 

Por que sua avaliação sobre o e-social é negativa?
O e-social é extremamente nocivo para a economia brasileira e vai gerar encargos adicionais para empresas e compromissos para os empregados, com perda da competitividade do setor. Da forma como está, a pequena e a média empresa não têm condições de implementar o processo que impõe uma série de obrigações. Vivemos no país mais burocrático do mundo, cheio de obrigações e normas e ainda inventamos mais coisas novas todos os dias. Nesse contexto, o e-social não é mais uma norma, apenas. É uma norma bruta que vai exigir que a empresa envie 180 informações sobre cada empregado, todos os meses. Não sabemos o que será feito com esses dados, mas, desde já, acreditamos que o sistema vai passar uma conta extra para a indústria.

Em meio a uma das disputas eleitorais mais polarizadas da história do país, qual o posicionamento da Fiemg?
Tenho enfrentado resistências internas quanto a isso, mas acredito que a postura da entidade deve ser apolítica. Não vou bancar nomes de um candidato. Mas lembro que a Fiemg, enquanto representante dos interesses da indústria, defende valores como livre iniciativa, redução do tamanho do Estado e do controle público sobre o setor produtivo. Vamos conversar com os dois candidatos ao governo do Estado e com os presidenciáveis e, a partir da próxima semana, vamos iniciar um processo de aproximação com os parlamentares que foram eleitos no Estado. Todos os iniciantes serão convidados para uma conversa sobre a indústria e desafios do setor. Este é o momento ideal porque eles ainda não assumiram o cargo. Acredito que essa é uma oportunidade interessante para apresentar a nossa atividade e valorizar o mandato dos deputados iniciantes. Temos que explicar o que está acontecendo com o setor e abordar temas por vezes espinhosos como os 41 projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional para retirar recursos do Sistema S e destiná-los para outras atividades. O Sistema S é que capacita os trabalhadores da indústria e esse serviço não pode ser interrompido em um momento como o atual, onde é preciso aumentar a produtividade do setor produtivo brasileiro.

Como o senhor avalia o atual cenário da indústria brasileira?
Depois da greve dos caminhoneiros, a economia parou. A situação ficou ainda pior no período eleitoral. O mercado está em compasso de espera porque os planos de investimento serão distintos, dependendo de quem vencer as eleições. Este é um momento de transição e a sociedade deve estar atenta para escolher certo e mudar para melhor. Diferente do comércio e do setor de serviços, a indústria está inserida em um ambiente de negócios global onde as condições de concorrência são absolutamente diferentes. Enquanto o preço da logística para levar um contêiner de Minas para o Espírito Santo for igual ao do trajeto China-Brasil, a indústria nacional vai perder espaço e competitividade no mercado nacional. Hoje, as empresas convivem com diversas questões tarifárias que dificultam as exportações e esses são temas que têm sido acompanhados pela Fiemg, para auxiliar os empresários a tomarem as decisões mais acertadas. Somando-se a isso, ações adotadas pelas esferas municipal, estadual e federal continuam a dificultar o trabalho dos empreendedores brasileiros, de forma geral. Assim, o país segue uma trajetória de perda de dinâmica de crescimento, o que é um problema não apenas para os investidores, mas para a população que necessita de empregos e melhoria de renda. A burocracia dos processos de abertura, licenciamento e operação também representa um gargalo para o empreendedor brasileiro. Há casos de projetos que são perdidos porque, depois de meses de investimentos e negociações, as licenças ambiental ou de operação não são concedidas. Infelizmente, o Estado cobra tudo de “primeiro mundo” das empresas, mas não oferece nada parecido.

E a questão tributária?
O sistema tributário tem alterações diárias que aumentam o custo de produção e reduzem a atratividade do mercado nacional para novos investidores. Com tudo isso, o que temos visto é a evasão de indústrias do Estado, para outras unidades da federação ou para outros países. O mesmo acontece com as vagas de emprego, tão necessárias para a recuperação da economia nacional. Lembrando que a indústria é o setor que paga os melhores salários.

O tamanho da máquina pública é um problema?
Sim. Hoje, os brasileiros vivem para sustentar uma máquina que é ineficiente, improdutiva e gera desigualdade social. A máquina pública deveria estar apoiando e não usufruindo da população, como acontece. É hora de mais Brasil e de menos corporativismo. Os grupos de interesses vão ter que dar espaço para que o interesse público prevaleça, sob pena de que todos morramos abraçados. A população já dá sua contribuição compulsória, mas é preciso que os privilégios deixem de ser vistos como direitos adquiridos. O momento é de sacrifício. Por outro lado, é preciso mudar a cultura do brasileiro sobre a atuação do Estado. Um Estado ‘mamãe’ que resolve todos os problemas não existe. Quanto maior a estrutura, maior a pobreza do país porque o Estado é pouco produtivo e drena recursos da sociedade.
 

O que o senhor sugere?
Desburocratizar os processos e criar condições para que o setor produtivo possa funcionar com maior autonomia são essenciais nesse momento em que se almeja a recuperação da economia brasileira. Quando o controle é exagerado, inibi-se a atividade produtiva. É preciso ter liberdade de ação para retomar os níveis ideais de produção e contribuir para o processo de desenvolvimento do país com geração de empregos e renda.

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por