Pobreza no campo preocupa assistência social em Minas; parceria com prefeituras é essencial

Bruno Moreno
bmoreno@hojeemdia.com.br
29/05/2017 às 06:00.
Atualizado em 15/11/2021 às 14:44

Desde o início da atual administração do governo estadual, a assistente social Rosilene Cristina Rocha, especialista em gestão social e de projetos para o setor pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), participa ativamente da elaboração de políticas públicas na Secretária de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social (Sedese). Já foi subsecretária e, há um ano, assumiu o comando da pasta. Um dos principais desafios é atender aos municípios rurais mais carentes de Minas.

Quais os desafios da secretaria?
Quando nós assumimos, trouxemos um diagnóstico que apontava três pontos muito importantes. Primeiro era preciso integrar duas áreas: assistência social e trabalho. Tratamos de fortalecer a secretaria de trabalho em dois setores. Um voltado para o mundo do trabalho, que tem uma relação mais próxima com os empresários, e o outro para a economia solidária. Estamos unificando a secretaria de trabalho com o público da assistência social, que são as famílias registradas no cadastro único dos programas sociais.

Em relação ao investimento do governo de Minas Gerais para a Estratégia de Enfrentamento da Pobreza no Campo, foram aplicados R$ 112,6 milhões em 2016, e serão empregados R$ 216 milhões em 2017

Em Minas Gerais, há mais ou menos 2 milhões de famílias no cadastro único e em torno um milhão no Bolsa Família. O outro ponto é que trouxemos um diagnóstico muito grave em relação à pobreza no campo no Estado. As pessoas do campo têm renda média 50% menor do que quem mora nas cidades. Por isso, lançamos o programa “Novos Encontros”, voltado para cerca de 280 cidades rurais de Minas, que estão com as estatísticas de pobreza muito acima da média. Nós fazemos uma estratégia com as prefeituras locais e também com a Cemig, para eletrificação rural. Entregamos 33 carros para as prefeituras irem até a zona rural e registrarem as famílias no cadastro único.

E qual o terceiro ponto?
A rede de proteção e assistência social. Estamos falando de equipamentos que possam atender especificamente as famílias vítimas de violência, mulheres, crianças vítimas de abuso sexual e de trabalho infantil. Isso apareceu em 15 dos 17 Fóruns de Governo.

O último repasse feito pelo Ministério do Trabalho para o governo do Estado foi em 25 de dezembro de 2014, no valor de R$ 11,7 milhões. Já estão empenhados, para a Sedese, quase R$ 20 milhões, mas os recursos não foram transferidos

Estamos abrindo os chamados Centros de Referência Regional Especializados em Assistência Social (Creas), financiados pelo governo federal. Inauguramos dois neste ano e esperamos inaugurar pelo menos mais nove pelo Estado, em cada território de desenvolvimento, até o fim dessa gestão.

Qual a diferença de Creas para o Cras (Centro de Referência em Assistência Social)?
O Cras atende ao dia a dia das famílias, vive a rotina delas. Mas, quando a família já tem uma ação de violência instalada, precisa de uma equipe multidisciplinar, de interface entre o centro especializado e o Ministério Público. Hoje, temos mais de 1.000 Cras em todos os municípios de Minas.

Qual é o orçamento da pasta?
Mais ou menos 200 milhões. Recebemos recursos do Fundo Nacional de Assistência Social, e temos o Fundo Estadual da Assistência Social, que financia os 853 municípios Mineiros. Como a área social é uma prioridade nesse governo, mesmo na crise, temos uma execução orçamentária muito boa: 73% do início do governo até agora com os recursos próprios. As equipes passam praticamente a semana inteira visitando os municípios, porque uma das queixas que a gente teve das prefeituras é que a Sedese não ia lá.

Em que medida que a aprovação da Emenda Constitucional 95/2016, que limita os investimentos, atrapalha o trabalho na área social?
Em entrevista recente, a secretária de Assistência Social em nível Federal disse que os recursos para área terminarão em agosto deste ano. Isso impacta na rotina das pessoas e, infelizmente, os mais pobres. A gente sabe muito bem que os municípios brasileiros precisam dos financiamentos federal e estadual. Um outro lado é que a área da assistência social tem serviços que atendem a crianças e idosos. Hoje, no Brasil, a área tem uma importância gigantesca.

Em Minas, dados do PNAD 2014 apontam que 147.289 crianças e adolescentes, entre 5 e 15 anos, estão em situação de trabalho infantil. Entre 2007 e 2013, foram notificados 992 acidentes graves de trabalho infanto-juvenil

 a área dos benefícios, o Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) representam, em média, 50% dos recursos que circulam nos municípios. Isso é muito mais do que o Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Se a reforma (da Previdência) passar do jeito que está, o dinheiro para as famílias vai reduzir muito. Um município que recebe em média R$ 10 milhões do FPM, recebe cerca de R$ 15 milhões dos benefícios. Então, o impacto na vida cotidiana das pessoas, de empobrecimento, de fome, é gigantesco.

Como está a situação das compras públicas do governo do Estado?
Temos um percentual pequeno. A gente quer que o Estado compre dos produtores. Já no segundo semestre, vamos aumentar o percentual de compras públicas na secretaria. Estamos juntando produtores e diretores de escolas para expandir para todos que compram para o setor público, numa parceria grande com o Sebrae, que está aplicando R$ 1 milhão. Estamos capacitando diretores de escola comprarem dos produtores, e os produtores a produzirem o que os diretores querem. Ao invés de servir morango no Jequitinhonha, vamos servir pequi, por exemplo.

O que é o programa Cuidar?
Pela primeira vez vamos cofinanciar as organizações que trabalham na assistência social. Começaremos por aquelas instituições que são de acolhimento, de longa permanência para idosos, abrigos para crianças e adolescentes com medidas protetivas, e lares para pessoas com deficiências. Vamos começar com R$ 10 milhões neste ano, até dezembro. Faremos assessoramento, acompanhamento e financiamento.

Em relação ao trabalho infantil, como está a situação hoje em Minas?
O trabalho infantil compreende as diversas atividades econômicas ou atividades de sobrevivência realizadas por crianças ou adolescentes em idade inferior a 16 anos, exceto na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos, sejam elas remuneradas ou não, com ou sem finalidade de lucro. O Brasil veio, nos últimos anos, diminuindo muito o número de crianças no trabalho infantil, mas, em toda crise econômica, há um refluxo. O Brasil todo vive isso e Minas Gerais também. Em Belo Horizonte, até muito pouco tempo, você não via crianças trabalhando nem vendendo flores nos bares à noite. Esse rumo de desproteção social e o aumento do desemprego têm reflexo imediato do trabalho infantil. Já vendo que deve haver um refluxo, trabalhamos parcerias com várias instituições, como times de futebol, para falar sobre o problema.

Os repasses do governo Federal estão em dia?
O Ministério do Trabalho está com uma dívida conosco de quase R$ 15 milhões desde 2014. Se a gente não tivesse assumido isso, já teríamos fechado o Sine, na Praça Sete. É dessa gravidade.

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