A Polícia Civil concluiu o inquérito que apurou a morte de Alice Martins Alves, mulher trans de 33 anos, após espancamento na região da Savassi, em 23 de outubro. Dois garçons de uma lanchonete, de 20 e 27 anos, foram indiciados por feminicídio, motivado por desprezo à identidade de gênero, decisão já reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo a Polícia Civil (PC), as agressões começaram após uma suposta dívida de R$ 22 que teria sido cobrada pelos garçons no estabelecimento onde Alice estava. Ela tentou deixar o local, mas acabou sendo perseguida pela dupla por até 200 metros. No trajeto, segundo as investigações, foi cercada.
Conforme a PC, as provas reunidas ao longo do inquérito deixam evidente que as agressões foram motivadas por transfobia. O garçom de 27 anos, que já possui antecedentes por roubo e uso de drogas, foi apontado como "líder" da ação.
Ataque só parou após chegada de entregar de app
Testemunhas relataram que ele se referiu a Alice pelo pronome masculino e proferiu xingamentos e injúrias como “safado” e “ladrão”, com caráter discriminatório. O colega, de 20 anos, participou diretamente das agressões, reforçando a desigualdade física e numérica contra a vítima.
A Polícia Civil destacou que o ataque só terminou após um entregador de aplicativo que passava pelo local ouvir os gritos de socorro e parar para ajudar. Quando se aproximou, encontrou Alice extremamente ensanguentada, com o nariz quebrado e a roupa encharcada de sangue. Assustada, ela apenas dizia “Eu quero sair daqui, me leva embora”. O agressor mais velho ainda teria ameaçado o motoboy, dizendo "Sai daqui, isso aqui não é problema seu".
Os garçons admitiram que estavam na cena do crime, mas tentaram alegar que Alice teria se jogado no chão e iniciado as agressões. A versão, entretanto, foi descartada pelos investigadores, que constataram que nenhum dos dois apresentava lesões compatíveis com defesa, além da documentação técnica e testemunhal que confirma a brutalidade dos ataques.
Alice chegou a registrar uma ocorrência dias após o ataque e relatou já ter sofrido tratamentos pejorativos de funcionários do mesmo estabelecimento, incluindo o uso do termo “traveco”. Porém, ela se mostrou receosa em revelar os responsáveis, pois foi ameaçada e temia pela segurança ao continuar frequentando a região.
Com o inquérito concluído, a Polícia Civil estabeleceu o nexo causal entre as agressões e a morte, ocorrida em 9 de novembro, por complicações hospitalares decorrentes do espancamento. O DHPP representou pela prisão cautelar dos dois indiciados, após decisão inicial da Justiça que negou o pedido em 14 de novembro. A investigação foi entregue novamente ao Judiciário.
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