meio ambiente

Criação do Parque Linear do Belvedere em BH mobiliza artistas e comunidade; área vai ser leiloada

Luciane Amaral
lamaral@hojeemdia.com.br
04/02/2022 às 17:56.
Atualizado em 04/02/2022 às 17:57

 (Marcelo Souto / Acervo pessoal)

(Marcelo Souto / Acervo pessoal)

Os trilhos que há muitos anos cortaram a Serra do Curral abrindo caminho para os vagões de minério hoje não levam nada a lugar algum. Mas carregam o sonho de muita gente quer ver na área verde às margens da linha férrea no bairro Belvedere, na região Centro-Sul de BH, um lugar de encontro e um refúgio da natureza em um parque linear.

Duas associações do Belvedere defendem a formalização do espaço como parque. No limite entre BH e Nova Lima, a área de 4 km por 80 m foi, informalmente, adotada pelos moradores que cuidam da preservação ambiental. E já plantaram cerca de 2,6 mil árvores, segundo Ubirajara Pires Glória, presidente da Associação dos Amigos do Bairro Belvedere. 

“Foram 900 pés de Ipê, 1,3 mil de pinus e cerca de 400 mudas de eucalipto, desde 2002, quando começamos a criar a proteção da área, consolidada em 2005, com a implantação da Estação Ecológica (do Cercadinho, maior área de preservação ambiental entre Belo Horizonte e Nova Lima, na região metropolitana)” - explica. “O governo nunca olhou por aqui. O pouco que foi feito lá foi a associação que fez.” continua.

No período da seca, os incêndios são comuns, segundo ele, como resultado da ação de invasores que têm interesse na área. “Várias árvores já foram destruídas. A fumaça incomoda muito quem vive ou trabalha na região e até pacientes que são atendidos em hospitais. A fuligem chega até lá” - diz o presidente da associação, que lembra que a área está inserida no Corredor Ecológico da Serra do Curral, que é tombada.

A área está abandonada mas foi adotada pela comunidade, que tem feito periodicamente a limpeza, afirma Marcelo Souto, que mora no Belvedere. "A população já abraçou esta área como parque. Famílias a frequentam para fazer caminhadas, andar de bicicleta e até mesmo como cenário para ensaios fotográficos. É um espaço único na cidade, praticamente pronto para a população.” 

Apoio de famosos

Várias personalidades da cena cultural de BH abraçaram a ideia de criar um parque no local. Em sua conta no Instagram, o cantor e compositor Samuel Rosa critica o crescimento desproporcional de prédios no Belvedere e ressalta a importância do lugar para a comunidade. “Um caminho verde (...) que se tornou o principal destino de lazer de quem mora na região e até para a população de Belo Horizonte” - diz o artista. 

O parceiro no Skank Lelo Zaneti também fez uma postagem defendendo a implantação do parque linear. “Isso aqui merece todo o nosso cuidado, o nosso respeito com as áreas verdes da cidade, com o meio ambiente. E isso não pode ser vendido e sucateado de forma alguma por pessoas que não estão interessadas no bem estar das pessoas e da vida dentro de uma cidade.”

Leilão em março

A declaração de Zaneti faz uma referência ao leilão da área, que está na faixa de servidão de um ramal desativado da Rede Ferroviária Federal S.A (RFFSA), previsto para março deste ano, segundo o Ministério da Economia. 

O ramal ligava a malha da extinta Rede, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, à Mina de Águas Claras, da Vale, já desativada. Funcionou até o início dos anos 2000, quando foi devolvida à União pela concessionária MRS Logística - uma sociedade anônima, que tem várias mineradoras como acionistas e que foi criada para operar a Malha Sudeste da RFFSA. Hoje está sob a tutela da Superintendência de Patrimônio da União.

Em novembro de 2021, a Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União (SPU), vinculada à Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados (SEDDM), lançou uma Proposta de Aquisição de Imóveis (PAI) ­– instrumento que permite que pessoas físicas ou jurídicas apresentem ofertas de compra de imóveis da União – para vender, entre outros ativos, 19 glebas (terrenos que não foram objeto de parcelamento aprovado ou regularizado e registrados em cartório), que somam aproximadamente 50 hectares, entre o Belvedere, na capital, e o Vila da Serra, em Nova Lima.

 (Associação dos Amigos do Bairro Belvedere / Divulgação)

(Associação dos Amigos do Bairro Belvedere / Divulgação)

Em janeiro, o Governo Federal iniciou o programa Incorpora Brasil! - Fundos de Investimento Imobiliários (FIIs), com a intenção, segundo o Ministério da Economia, de criar fundos com vocação similar, como fundos de desenvolvimento e de logística. “A partir disso, grandes áreas poderão ser incorporadas para a criação de novos bairros”. O processo para a escolha dos administradores desses fundos já começou e os editais devem ser lançados em março. A área no Belvedere está entre os 237 imóveis à disposição dos FIIs. 

Importância do Parque Linear

Como o nome sugere, parques lineares têm comprimento maior que a largura, formando uma “linha” de área verde, como é o caso do High Line Park, em Nova York, nos Estados Unidos, implantado em uma antiga ferrovia aérea que seria demolida.

Em BH, há vários projetos para o Parque Linear do Belvedere, que preveem a instalação de equipamentos de lazer, como parquinho infantil, ciclovia, pistas de corrida, de caminhada e de skate, lanchonetes, mirantes e até um Museu Ferroviário. 

Além disso, há a ideia de fomentar o turismo, reativando parte da ferrovia para ligar o bairro até o Mercado de Origem, às margens da BR-040. O trecho está pronto para operar. E, com a retirada de invasores em um trecho mais à frente da linha férrea, será possível levar as composições até o Instituto Inhotim, em Brumadinho. Com a reativação dos trens, a população de cidades da RMBH como Mário Campos, Sarzedo, Ibirité poderiam se beneficiar de mais um meio de transporte coletivo para a capital. 

Além de “compridos”, os parques lineares têm outra característica peculiar: são espaços abertos na cidade, sem área delimitada, portões ou desenho regular. E, além de servir como áreas de lazer, desenvolvem-se ao largo de importantes eixos viários ou ao longo de cursos d’água, com o objetivo, neste caso, de preservação de recursos hídricos.

O parque linear do Belvedere também cumpre função, já que o trecho de terra conhecido como “buracão”, que fica entre o pontilhão e o BH Shopping, assim como a própria linha do trem, servem como área de amortecimento de água da chuva, que infiltra no solo e abastece o manancial da Estação Cercadinho, da Copasa. 

Em uma postagem em suas redes sociais, o músico Celso Adolfo fala da importância da preservação. “Ali tem a linha de trem e, quando chove, a água vai correndo ali pela linha de trem e vai pro Cercadinho, que é uma reserva importante para mandar água para BH”.

Afluente do Ribeirão Arrudas (que deságua no Rio das Velhas), o manancial do Cercadinho  já foi o principal da capital mineira e é o único que está no território de BH. Até hoje, a Copasa faz a captação dessa água para abastecer a população. 

Outro artista que apoia a instalação do parque é Henrique Portugal, que, em suas redes sociais, faz um convite: “Procure saber sobre o Parque Linear, é um projeto muito bacana. (...) Eu tenho certeza que você vai gostar e vai aprovar. A gente tem que perguntar pra população: vocês querem mais prédios, vocês querem mais adensamento urbano? Eu acho que tá na hora de a gente pensar um pouco sobre mais o que a gente planeja para nossas vidas e como a gente quer viver, daqui pra frente.”

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