Disciplina do curso de Arquitetura da UFMG será revista depois de denúncia de preconceito

Paula Bicalho
pbicalho@hojeemdia.com.br
Publicado em 01/08/2017 às 21:20.Atualizado em 15/11/2021 às 09:52.
 (Divulgação EA-UFMG)
(Divulgação EA-UFMG)

A Câmara Departamental do Departamento de Projetos (PRJ) da Escola de Arquitetura da UFMG divulgou nesta terça-feira (1º), uma nota em que informa que irá rever a disciplina "Casa Grande", depois que o Diretório Acadêmico do curso postou, nas redes sociais, uma nota de repúdio acusando a matéria de ser racista e preconceituosa. 

"Casa Grande" previa a criação do projeto de uma residência com aproximadamente 800 m² no condomínio Vale dos Cristais em Nova Lima - MG que deveria conter na área de serviço, quartos e banheiros para oito empregados.

Os alunos alegaram que "como discutido em diversas disciplinas na EAD-UFMG, o quarto de empregada tem como origem a segregação escravista. Ele surge como uma solução para separar empregados e patrões que permaneceram vivendo juntos após a abolição, em 1888".

A nota do Departamento de Arquitetura, assinada por Guilherme de Vasconcelos, presidente da Câmara Departamental, afirma que "o racismo denunciado na nota coletiva de repúdio nos faz refletir sobre a disciplina, tendo em vista que o termo 'Casa Grande' remete à carga histórica e sua correlação com a senzala, o que é agravado ao ser associado com o programa proposto". 

"Ainda que o professor Otávio Curtiss afirme que essa não tenha sido essa a sua intenção, os efeitos sinalizam a necessidade de discutir o racismo estrutural. É legítima a nota de repúdio escrita pelo D.A.EA", continua o comunicado.

No documento, a Câmara se compromete a “aprimorar os processos de aprovação da oferta das disciplinas, tornando-os ainda mais criteriosos e zelando para que não ocorram manifestações preconceituosas em suas formas explícitas ou veladas”. 

Veja a nota na íntegra: 

Ao Diretório Acadêmico da Escola de Arquitetura da UFMG (D.A.EA), 

Em resposta à Nota Coletiva de Repúdio à Disciplina “Casa Grande” enviada pelo D.A.EA ao Departamento de Projetos (PRJ) no dia 27 de julho de 2017, a Câmara Departamental do PRJ, reunida no dia 31 de julho de 2017, ouviu o professor responsável pela proposta da disciplina e a representação discente, e se posiciona a partir das seguintes considerações. 

O grupo de disciplinas de projeto flexibilizadas (Pflex) foi implementado pelo PRJ no intuito de ampliar a diversidade e a pluralidade de ofertas e a liberdade de escolha dos alunos. Para que isso seja possível, oPRJ preza pela autonomia de seu corpo docente na elaboração de suas propostas de disciplinas. Contudo, ainda que a câmara do PRJ seja totalmente contrária à censura das propostas de Pflex, o racismo denunciado na nota coletiva de repúdio nos faz refletir sobre a disciplina, tendo em vista que o termo“Casa Grande” remete à carga histórica e sua correlação com a senzala, o que é agravado ao ser associado com o programa proposto. Ainda que o professor afirme que essa não tenha sido sua intenção, os efeito snos sinalizam a necessidade de discutir o racismo estrutural. 

 Para além dos esforços dessa Escola na árdua tarefa de se tornar mais democrática e inclusiva, e das políticas públicas de ações afirmativas empreendidas nos últimos anos, principalmente por meio do sistema de cotas para a população negra e pobre, esse episódio nos indica que temos ainda uma longa jornada contra o racismo pela frente.

 A Câmara do PRJ se compromete a não se furtar do desafio de erradicar atos discriminatórios de qualquer natureza no âmbito do Departamento, agindo em consonância com a Resolução 09/2016 do Conselho Universitário da UFMG de 31 de maio de 2016, que dispõe sobre a violação de direitos humanos. Por conseguinte, reconhecemos como legítima a nota de repúdio escrita pelo D.A.E A e nos comprometemos a aprimorar os processos de aprovação da oferta das disciplinas, tornando-os ainda mais criteriosos e zelando para que não ocorram manifestações preconceituosas em suas formas explícitas ou veladas. Além disso, nos comprometemos também a ampliar o debate acerca do papel das disciplinas de projeto no âmbito de uma universidade pública e gratuita, visando balizar os objetivos dos Pflex. 

Na reunião, deliberamos que a disciplina seja revista e submetida para aprovação pela Câmara Departamental visando evitar qualquer tipo de ambiguidade. Deliberamos também que os alunos matriculados no Pflex em questão não sofrerão nenhum ônus. 

 Cientes da importância da liberdade de pensamento e de expressão, da postura crítica e da autonomia universitária, reafirmamos o nosso compromisso com a diversidade e pluralidade nas disciplinas desse Departamento, sem perder de vista o combate às ideologias, valores e opiniões que contrariem os princípios do Estado Democrático de Direito. 

 Por último, nos desculpamos frente a todos que se sentiram ofendidos no desenrolar desse episódio. 

Atenciosamente, 
Guilherme de Vasconcelos 
Presidente da Câmara Departamental do PRJ 
Escola de Arquitetura da UFMG

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