Falsa comunicação de crime cresce 179% em BH; infrator quer burlar seguro

Simon Nascimento
09/03/2019 às 14:23.
Atualizado em 05/09/2021 às 16:54
 (Editoria de Arte)

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A cada dois dias, uma pessoa é presa em Belo Horizonte por falsa comunicação de crime. A média leva em conta os 162 conduzidos à delegacia em 2018. O número é quase o triplo do registrado no ano anterior, quando ocorreram 58 detenções. A farsa pode render um ano e seis meses de cadeia ou multa, que tem valor estipulado pela Justiça.

As estatísticas são da Secretaria de Estado e Segurança Pública (Sesp). Os infratores foram desmascarados durante o registro da ocorrência ou na investigação do fato. Para especialistas, o aumento se deve à conduta de aproveitadores que buscam obter vantagens a qualquer custo. Já as autoridades atribuem o salto à maior eficácia na apuração dos delitos.

A maioria dos conduzidos é formada por quem teve algum dano no celular ou no veículo e inventou um roubo para receber o boletim policial. O documento seria usado junto à seguradora para garantir o ressarcimento do telefone ou carro.

Recentemente, um homem acionou a PM denunciando que o automóvel dele havia sido roubado na zona Norte de BH. Porém, a corporação recebeu denúncia anônima de que o mesmo veículo estava batido em uma árvore no Serra Verde, na mesma região. 

Ao indagar o proprietário, os policiais desconfiaram da versão e o homem confessou que se envolveu em um acidente de trânsito. Na delegacia, ele assinou um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO). Posteriormente, será intimado a prestar esclarecimentos nos tribunais.

Viver a fantasia

Psicanalista e professora da Escola Freudiana de BH, Yolanda Mourão acredita que a invenção das histórias é uma conduta de má-fé. Autora de três livros sobre a psicanálise, ela diz que essas pessoas acabam vivendo a mentira. “Elas acreditam nessa fantasia, impulsionadas pelo desejo de convencer o outro para obter alguma vantagem”.

De acordo com a tenente Gisele Couto, assessora de comunicação do Comando de Policiamento da Capital (CPC), os aproveitadores usam enredos bem criados, mas acabam caindo em contradição. “Várias características nos levam à verdade. A pessoa ainda pode ser desmentida por câmeras de segurança”.

Chefe do 1º Departamento da Polícia Civil, o delegado Wagner Sales reforça o discurso. Segundo ele, a identificação da farsa ocorre de maneira rápida e o golpe contra as seguradoras não chega a ser aplicado. Há casos, conforme Sales, em que carros são destruídos e as peças vendidas para fortalecer a versão de roubo.

Estelionato

O delegado explica que há complicações no inquérito policial. “A falsa comunicação de um furto ou roubo vai incidir em estelionato se a pessoa conseguir obter a vantagem indevida”.

Presidente da Comissão de Direito Penal Econômico da Ordem dos Advogados do Brasil seção Minas Gerais, Guilherme Vitor de Carvalho acredita que há uma proximidade grande entre a invenção dessas histórias relacionadas a crimes e o estelionato. Para o especialista, quem inventa tais situações também poderia ser enquadrado no artigo 171 do Código Penal, que trata sobre quem oculta, destrói ou vende algum bem com o intuito de obter indenização ou valor de seguro.

Delito também gera prejuízos aos cofres públicos

O atendimento à falsa comunicação de um crime gera prejuízos financeiros e operacionais ao Estado. Os valores desperdiçados não foram informados. Porém, a principal consequência descrita pelas polícias Militar e Civil foi a do empenho de equipes em situações fictícias, deixando a sociedade desguarnecida em outras situações.

“A perda é grande. A população precisa se conscientizar. O fato vai gerar o acionamento de uma viatura da PM, confecção do boletim de ocorrência, encaminhamento à Polícia Civil e deslocamento de investigadores. Toda a movimentação da máquina estatal gera custos”, acrescenta o delegado Wagner Sales.

O Hoje em Dia procurou seguradoras com atuação nacional, mas nenhuma disponibilizou fonte para falar sobre o assunto. O Sindicato das Seguradoras de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e Distrito Federal informou que “o número de sinistros em 2017 foi de cerca de R$ 33 bilhões. Desses, 15,8% são suspeitos, ou seja, R$ 5,2 bilhões. As fraudes comprovadas representam R$ 730,1 milhões”. 

A entidade ainda alerta para os danos causados aos próprios contratantes do seguro. “A fraude tem a capacidade de desequilibrar o sistema securitário e quem sofre as consequências é tanto a seguradora quanto o consumidor, que é impactado com pagamento de prêmios mais altos”.

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