Jogos Indígenas atraem 600 atletas em 'luta' para manter viva a memória de povos

Manoel Freitas
07/01/2019 às 20:38.
Atualizado em 05/09/2021 às 15:55
 (Manoel Freitas/O Norte)

(Manoel Freitas/O Norte)

SÃO JOÃO DAS MISSÕES – O sertão foi palco, pela segunda vez, de um ritual de valorização da cultura e da união de quatro povos indígenas que vivem no Estado. Durante quatro dias, mais de 600 atletas nativos dividiram o espaço na tribo Xakriabá, em São João das Missões, na região Norte, para os VI Jogos Indígenas de Minas Gerais.

Nas terras do maior grupo étnico do território, na Aldeia Barreiro Preto, os quatro povos se enfrentaram em oito competições: derruba o toco, arco e flecha, cabo-de-guerra, zarabatana, corrida do maracá, bodok, arremesso de lança e futebol.

Participaram do torneio membros das etnias Xakriabá, Krenak, Xucuru Kariri e Pataxó – este distribuído em quatro locais em Minas: Carmésia, Açucena, Candonga e Itapecerica. A iniciativa é para valorizar e perpetuar as tradições através dos jogos, criados em 1996 pelo Comitê Intertribal de Memória e Ciência Indígena.

Para quem imagina que os grupos vêm perdendo força e as tradições culturais nos últimos anos, o evento demonstra o contrário. A pintura no rosto é característica entre os índios, marca de que os traços étnicos continuam muito vivos.

Além disso, a presença das crianças, interessadas nas modalidades, é grande. Correndo pela tribo, a diversão principal é o arco e flecha, nada de carrinhos ou brinquedos comuns à faixa etária.

Antropólogo da Fundação Nacional do Índio (Funai), França Júnior, que atua nas 34 aldeias Xakriabá que fazem limite com os municípios de Manga, Miravânia, Montalvânia, Januária e Itacarambi, lembra que na competição “há pouco valor para a vitória e mais atenção para a comunhão, com forte impacto na cultura de cada povo”.

A pintura corporal, muito mais forte ainda durante os quatro dias do torneio, “é uma tradição com profundo significado para os povos indígenas, sinal de respeito pela terra e pela cultura”, destaca o especialista.

O antropólogo reforça que o motivo principal dos jogos “é aproximar os povos indígenas, de modo a fortificar as culturas e tradições”.Manoel Freitas/O NorteEm meio a várias atividades esportivas, a modalidade arco e flecha chamou a atenção de várias pessoas, principalmente de crianças e adolescentes

Integração

“Os jogos nos permitem conhecer a realidade de cada povo”, argumentou o cacique Thyeru Jal, que assumiu a tribo Xucuru Kariri em 2015, após a morte do pai.

Ele lembra que a competição o permitiu pisar em solo Xakriabá. “Depois de uma partida de futebol, da derrubada de um toco, a gente senta para saber como estão as questões internas de cada povo, vai descobrindo o segredo um do outro para depois juntar tudo e fazer um bolo só”, disse.

A escolha de São João das Missões para a realização dos jogos levou em conta, também, o fato de o município ser administrado, pela terceira vez, pelo índio José Nunes. Em 1987, com 11 anos de idade, ele foi testemunha da morte do pai, o cacique Rosalino Gomes, na “Chacina Xakriabá”, que ganhou repercussão internacional. Após o episódio, a Funai demarcou as terras da etnia.

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