(Maurício Vieira)
Desde que o Mercado Central de Belo Horizonte se instalou no endereço atual, na avenida Augusto de Lima, no Centro da capital, 89 anos se passaram. De lá para cá, o espaço que começou focado nos hortifrutigranjeiros expandiu tanto a oferta de produtos que deixou de ser um simples comércio para se tornar um dos principais pontos turísticos da cidade.
Em quase nove décadas, o centro se firmou como referência em gastronomia e, hoje, recebe cerca de 30 mil visitantes todos os dias, além de contar com aproximadamente 400 lojas, segundo informações da administração. São frutas, verduras, legumes, artesanatos, panelas, doces, cereais, pães, bebidas, carnes, temperos, condimentos, queijos e utensílios domésticos de todos os tipos possíveis.
Nesse emaranhado de produtos e pessoas, o que chama a atenção é a harmonia entre a tradição e a modernidade. Se, de um lado, comerciantes antigos mantêm costumes de mais de meio século de atuação, de outro, jovens empreendedores apostam em novas mercadorias.
É o caso de Guilherme Vieira Brito, fundador da loja Roça Capital, que nasceu com o objetivo de inovar no ramo dos queijos, um dos mais disputados do Mercado Central. Filho de comerciantes do local, ele passou cinco anos viajando pela Europa antes de decidir investir no próprio negócio.
O desejo de trabalhar com algo atrelado à cultura mineira levou o empreendedor ao resgate do queijo artesanal. “Entrar no mercado não foi fácil por conta do tradicionalismo, mas viemos com essa pegada diferente, de manter a tradição usando a tecnologia”, explica.
“Temos uma câmara com controle de temperatura e umidade. Há poucos anos, não se falava nisso. Temos também o queijo artesanal com mofo na casca, que está se difundindo”, acrescenta Brito.Maurício VieiraAdemir, Nilson e Willer se reúnem toda semana no Mercado Central para degustar o famoso fígado acebolado com jiló
Resistência
Longe da tecnologia, mas fiel ao propósito firmado há 63 anos, José de Aguiar Gomes de Oliveira, fundador do Rei do Berrante, já perdeu as contas de quantos instrumentos vendeu desde que começou a jornada no centro comercial.
O ex-fazendeiro conta que, aos poucos, também diversificou a oferta da loja que só comercializava berrantes. “Trabalhei com milho de pipoca e pimenta malagueta. Mas agora tem laço, chicote, cabresto, rédea, porta-canivete e colher de pau”, enumera.
Aos 93 anos, o senhor Aguiar, como é conhecido, alega estar cansado e pensando em parar, mas não esconde a alegria em comemorar mais um aniversário do espaço que ajudou a ser reconhecido nacionalmente. “Fico feliz demais a cada aniversário. Além de bonito, ele é muito seguro. Aqui você não vê ladrão, como em outros comércios. Tem que comemorar demais”, avalia.
Maurício Vieira
Guilherme Brito decidiu inovar na comercialização dos queijos
Espaço democrático
Quem frequenta o Mercado Central garante que não há espaço mais democrático em BH. O aposentado Ademir da Costa, de 70 anos, diz que há quatro décadas considera o local como uma segunda casa.
Com os amigos Nilson Vale, de 64, e Willer Silva, de 43, ele ostenta como um troféu o prato de fígado acebolado com jiló, uma das iguarias mais famosas do estabelecimento. “A sensação de estar no mercado é maravilhosa. Nada se compara a esse momento de prazer e confraternização que vivemos aqui toda semana. Que venham mais 89 anos”.
E o aposentado não está sozinho nessa comemoração. O comerciante José Agostinho Quadros, conhecido como Nem do Mercado, afirma que, mais do que ninguém, deve ao espaço toda gratidão.
Vindo de Carmo do Cajuru para a capital aos 13 anos e sem nenhum dinheiro no bolso, ele começou a trabalhar como ajudante das lojas, quando o local ainda estava em obras. Com o tempo, adquiriu um espaço próprio e chegou a ser presidente do centro comercial. “Gosto desse lugar como de minha casa. Tudo de bom que aconteceu comigo e com minha família devo ao Mercado Central”, diz.Maurício Vieira“Gosto desse lugar como se fosse minha casa”, diz o lojista Nem do Mercado
Diversidade
A capacidade de se adaptar às mudanças ao longo do tempo não é apenas uma característica do Mercado Central, mas talvez o principal motivo para o sucesso do empreendimento. Quem afirma é o diretor-presidente Geraldo Henrique Figueiredo Campos.
Neto de comerciantes do local, ele é membro da terceira geração da família a atuar no segmento. Para ele, uma das características que mais ajudam a explicar o que é o ponto turístico é a diversidade.
“Todas as classes sociais frequentam o mercado. Como há um mix muito variado de produtos, há também um grande mix de consumidores e, é claro, inúmeras histórias de vida aqui dentro”.