Investigação

Morte de Alice: dívida de R$ 22 foi estopim para agressão, mas motivação do crime é transfobia

Apuração da PC aponta que garçons devem responder por feminicídio

Ana Luísa Ribeiro
aribeiro@hojeemdia.com.br
Publicado em 04/12/2025 às 18:10.Atualizado em 04/12/2025 às 18:39.
Alice Martins Alves, de 33 anos, morreu em 9 de novembro após complicações causadas por espancamento; Polícia Civil indiciou dois garçons por feminicídio (Divulgação/Redes Sociais)
Alice Martins Alves, de 33 anos, morreu em 9 de novembro após complicações causadas por espancamento; Polícia Civil indiciou dois garçons por feminicídio (Divulgação/Redes Sociais)

As investigações da Polícia Civil apontam que uma suposta dívida de R$ 22 cobrada de Alice Martins Alves, mulher trans de 33 anos, serviu apenas como estopim para a sequência de agressões motivadas, na verdade, por transfobia. A vítima havia consumido na lanchonete, na região da Savassi, em 23 de outubro, mas afirmava ter quitado a conta antes de ir embora. Ela foi espancada e morreu dias depois. 

De acordo com a delegada Iara França, mesmo que o valor estivesse pendente, os garçons deixariam de receber apenas R$ 2,20, referentes aos 10% de gorjeta. Ainda assim, perseguiram Alice por até 200 metros, a cercaram e iniciaram as agressões que resultariam na morte em 9 de novembro, após internação. 

A delegada responsável pela investigação explicou ainda que o verdadeiro motivo da violência foi o desprezo pela identidade de gênero da vítima. Durante todo o ataque, segundo o inquérito, os garçons não exigiram o valor supostamente devido.

A polícia concluiu que o objetivo era punir Alice por ser quem ela era. A vítima que já tinha ingerido bebida alcoólica, estava desorientada e repetia que já havia pago a conta. Os pertences dela estavam visíveis na bolsa, celular e carteira, e em nenhum momento os investigados tentaram pegá-los. 

Só os dois garçons

A corporação também destacou que não há indícios de envolvimento dos proprietários ou de outros funcionários do comércio, sendo uma ação apenas dos dois garçons. Ambos foram ouvidos e reconheceram estar na cena do crime, mas negam ter iniciado as agressões. 

Indiciados por feminicídio, os suspeitos tiveram a prisão cautelar representada pela Polícia Civil em duas ocasiões - a primeira negada pela Justiça em 14 de novembro, antes da conclusão do inquérito. Com os elementos reunidos pela PC, o novo pedido de encarceramento segue para apreciação do Ministério Público e do Judiciário.

Possível negligência médica será investigada

A Polícia Civil solicitou ao Ministério Público a apuração de possível negligência médica após as agressões sofridas por Alice. De acordo com a delegada Iara França, o histórico de atendimentos demonstra que a vítima buscou ajuda diversas vezes, mas acabou liberada mesmo com lesões graves.

Ela explicou que Alice foi inicialmente levada a uma UPA ainda no dia do espancamento e, dias depois, em 26 de outubro, procurou um hospital particular em Contagem, onde foram constatadas costelas quebradas.

Porém, o quadro evoluiu silenciosamente. Alice foi internada novamente em 8 de novembro, quando exames identificaram perfuração no intestino decorrente das agressões. No dia 9, ela morreu por infecção generalizada em um hospital de Betim.

Outro ponto sob análise é a responsabilidade pela comunicação do óbito às autoridades. A Polícia Civil só tomou ciência do caso em 10 de novembro, data do sepultamento. “A polícia soube do caso dia 10 de novembro, com o sepultamento”, ressaltou Iara França, ao afirmar que o médico que assinou o atestado não notificou a corporação sobre a morte violenta.

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