Servidores usam mordaça para protestar contra PEC que retira referendo popular para privatizações
Pela terceira reunião seguida, a CCJ da ALMG deixou de votar o parecer pela legalidade da Proposta de Emenda à Constituição
Em reunião realizada nesta segunda-feira (30) na Assembleia Legislativa de Minas (ALMG), servidores da Cemig e da Copasa usaram mordaças para protestar contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 24/23. De autoria do governador Romeu Zema (Novo), ela retira a exigência de referendo popular para a desestatização de empresas estatais.
Pela terceira reunião seguida, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) deixou de votar o parecer pela legalidade da PEC.
Após um intenso processo de obstrução por deputados da oposição, que durou mais de duas horas, o esvaziamento do quórum da reunião aconteceu em decorrência de uma polêmica envolvendo as propostas de emenda apresentadas pelos deputados da oposição.
Uma das propostas, de autoria do deputado Doutor Jean Freire (PT), tem 122 páginas, e outra, do deputado Professor Cleiton (PV), mais de 300. Inicialmente, o presidente da CCJ, deputado Doorgal Andrada (PRD), recusou pedido da oposição para que as emendas fossem lidas na íntegra, por considerar o seu conteúdo meramente protelatório.
Doorgal Andrada também citou decisão da Mesa da Assembleia para balizar seu julgamento. A recusa da leitura foi contestada pelo autor de uma das propostas de emenda, deputado Doutor Jean Freire, que exigiu ao menos que a votação do parecer fosse precedida pela publicação da íntegra das propostas de emenda. O pedido foi acatado pelo presidente da CCJ, provocando o fim da reunião.
A tramitação da PEC está inserida no contexto das discussões do Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag). Isso porque o Propag permite uma amortização da dívida mediante a transferência para a União de ativos como imóveis e empresas estatais pertencem ao Estado, como a Cemig e a Copasa.
Deputados da oposição argumentaram, no entanto, que a revogação da exigência de referendo popular não é necessária para federalização das empresas estaduais, mas apenas se a intenção do governador Romeu Zema for vendê-las à iniciativa privada.
Para possibilitar as transferências das estatais, a PEC 24/23 propõe revogar dois incisos do artigo 14 da Constituição do Estado. O primeiro determina quórum de 3/5 dos membros da Assembleia para aprovar alteração da estrutura societária ou outras mudanças nas empresas públicas.
O outro obriga a submissão a referendo popular toda iniciativa de desestatizar empresa de propriedade do Estado prestadora de serviço público de distribuição de gás canalizado, de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica ou de saneamento básico. Se a PEC 24/23 for aprovada, o quórum qualificado e o referendo deixariam de ser exigidos.
Em seu parecer, que foi aprovado, o relator Thiago Cota (PDT) opinou pela legalidade da proposta.
“Do ponto de vista jurídico, não há que se falar em vício de iniciativa e tampouco de competência. Quanto ao conteúdo, trata-se de decisão política, a cargo dos representantes do povo mineiro", destacou o parlamentar.
Durante a discussão, a deputada Beatriz Cerqueira (PT) leu questão de ordem de sua autoria em que argumenta que a PEC 24/23 fere o princípio constitucional de separação dos Poderes.
Para Beatriz Cerqueira, ao tentar retirar da Constituição Estadual hipótese de competência exclusiva do Poder Legislativo, relativa ao referendo, o Poder Executivo incorre em ofensa direta às Constituições Federal e Estadual, ferindo o princípio da separação das atribuições dos Poderes. Por isso ela solicita, por meio da questão de ordem, o arquivamento da PEC.
“Que tragédia é uma sociedade em que uma professora tem que ocupar o microfone para falar que água e energia são recursos estratégicos", comentou Beatriz Cerqueira.
A deputada acrescentou que muitos países hoje estão em guerra por recursos, como água, energia e terras raras, e também por soberania, algo que Minas Gerais está abrindo mão com facilidade, por meio desta Proposta de Emenda à Constituição.
Durante o debate, tanto o deputado Professor Cleiton quanto o deputado Lucas Lasmar (Rede) disseram acreditar que a intenção do governo em aprovar a PEC 24/25 é viabilizar a privatização da Cemig e da Copasa, e não sua federalização. “Vice-governador já disse que a intenção é privatizar as empresas para usar o recurso no abatimento da dívida”, afirmou Professor Cleiton.
Lucas Lasmar também advertiu para a possibilidade de aumento das tarifas de água e energia para a população, caso as estatais sejam de fato privatizadas.
Após a votação do parecer pela CCJ, a PEC 24/23 precisa ser analisada por comissão especial, antes de ir a Plenário em 1º turno. A aprovação de Proposta de Emenda à Constituição em Plenário depende do voto favorável de 48 parlamentares.