Softwares de relacionamento pouco seguros favorecem ações criminosas

Letícia Alves - Hoje em Dia
25/03/2015 às 08:24.
Atualizado em 16/11/2021 às 23:22
 (Samuel Costa)

(Samuel Costa)

Cada vez mais populares, aplicativos de namoro são uma janela aberta para a ação de estelionatários. Estudo feito pela IBM – gigante americana da área de informática – em 41 softwares atualmente em uso constatou falhas de segurança médias e graves em 26 deles (63% do total). Um terço das ferramentas também possibilita acesso à câmera do celular e 73% a dados de GPS do usuário.

Tais falhas permitem que dados importantes e sigilosos dos internautas – como o número de cartão de crédito – sejam acessados com facilidade. Quem usa o celular da empresa para acessar as contas on-line também pode ter informações confidenciais vazadas. 

Apenas na Delegacia Especializada na Investigação de Crimes Cibernéticos (Deicc), em Belo Horizonte, foram registrados 1.081 delitos no ano passado. As ocorrências envolvem crimes em qualquer dispositivo com acesso à internet e, nos celulares, os diversos aplicativos, incluindo os de namoro. 

“Às vezes, a vítima nem sabe que o golpe foi pelo aplicativo. O número do cartão é roubado e é registrado como estelionato, mas a pessoa não sabe por onde foi fraudada. Isso porque ela usa e-mail, Facebook e vários outros aplicativos no celular”, explica a delegada titular da Deicc, Paloma Bonson. 

Processo

Os golpes são resultado das permissões aprovadas pelos usuários, antes da instalação do aplicativo, e da fragilidade na segurança desses sistemas, avalia o professor titular de Ciência da Computação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Vagner Meira Júnior. 

“A primeira ponta é o próprio usuário dos aplicativos de relacionamento. Para ter acesso, ele tem que aprovar uma série de permissões, como o acesso à localização. O app pode sair pegando esses dados do celular e, como não é bem construído, ou seja, é vulnerável, o hacker acaba roubando as informações”, detalha Vagner. 

O professor afirma que, como nas fraudes em computadores, os hackers utilizam as informações para aplicar golpes mais elaborados. “O bandido ‘ataca’ o seu celular e quer capturar o som e a imagem. Ele não quer te apresentar para uma pessoa. Ele quer usar aquela brecha para conseguir informações sobre você e usar tudo isso em golpes”, esclarece.

Experiência 

A analista de sistemas Stephane Nardy, de 30 anos, teve os dados furtados por um hacker. O golpista pegou informações como CPF, nome e endereço, e fez uma compra no valor de R$1.120,51 em uma loja de departamentos. Ela não sabe de onde partiu a ação, já que utiliza a internet em vários dispositivos, além do celular. 

Com o vazamento de dados, os usuários também podem ser vítimas de ameaças e difamação. Nesses casos, o golpista tenta obter vantagem ou afetar a imagem da pessoa. 

Crimes virtuais, como vazamento de fotos e roubo de dados do cartão de crédito, devem ser registrados na delegacia mais próxima

 

 

 

Cautela na hora de configurar aplicativo é essencial para evitar vazamento de dados

Além de invasão por hackers, os sites de relacionamento também são alvo de scammers, como são chamados os golpistas do romance. Ao invés de apossar-se da conta do usuário, o criminoso cria um perfil falso para conquistar a vítima e aplicar golpes, desde estelionato a crimes graves, como sequestro.

Normalmente, esse tipo de criminoso “hi-tech” é uma pessoa articulada, que cuida da aparência e ainda simula ter uma carreira profissional sólida. Os scammers agem de maneira padrão: mantêm o bate-papo por determinado tempo até perceberem certa intimidade com a vítima. 

Dicas

A titular da Delegacia Especializada de Investigações de Crimes Cibernéticos de BH, Paloma Bonson, recomenda não disponibilizar dados pessoais, como data de nascimento e local de trabalho, nesses aplicativos. Outra dica é usar as configurações de privacidade para permitir apenas que pessoas autorizadas tenham acesso a fotos e dados. O bom e velho antivírus é outro sistema que não pode faltar. 

“Não coloque dados pessoais em sites que você não confia. As pessoas têm que ter esse cuidado. Se for entrar em site para encontrar um parceiro, eu recomendo muita cautela. Pesquise na internet a idoneidade do aplicativo”, alerta Bonson. 

Se mesmo com todos os cuidados, você acabar sendo vítima de um desses golpes é preciso ir até uma delegacia para prestar queixa. É importante juntar todas as provas possíveis, como prints (captura da imagem da tela) de conversas. 

Precaução

Para não ser enganado por usuários com perfis falsos, o arquiteto e urbanista Matheus Carvalho, de 26 anos, tem cuidado redobrado. Ele usa o Tinder e o Adote um Cara, dois aplicativos populares para conhecer mulheres. “Eu sempre tomo cuidado. Analiso o perfil do Facebook para ver se não é fake (falso). Se tem uma quantidade boa de amigos, acima de 400, já é positivo”, afirma. 

Ele também só utiliza aplicativos de lojas confiáveis e ainda possui um software especial para analisar o risco de cada instalação. 

Whatsapp

Dos apps de namoro, é normal as conversas migrarem para o WhatsApp. Se isso acontecer, é preciso ficar atento ao famoso golpe das chamadas. Como foi anunciado no ano passado que seria possível realizar ligações pelo aplicativo, muitos golpistas têm aproveitado a informação para aplicar fraudes. 

“Os hackers estão divulgado links para que a pessoa cadastre e passe a fazer ligações pelo celular. Mas esse recurso ainda não foi liberado”, explica Paloma. Quando os usuários cadastram no site do link, acabam instalando um software malicioso no celular. “Elas até conseguem fazer ligações, mas é pelo celular e não pelo WhatsApp”, completa a delegada. 

WhatsApp é porta aberta para pornografia infantil

Outro crime cometido pelo WhatsApp envolve o compartilhamento de pornografia infantil, alerta o coordenador Estadual de Combate aos Crimes Cibernéticos do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Mario Konichi Higuchi Júnior. 

Desde junho do ano passado, 55 ocorrências de pornografia infantil foram registradas na coordenadoria especializada ou encaminhadas de promotorias do interior do Estado. 

“Há muitas situações em que a menina é menor de idade, manda foto para o namorado e ele espalha para a escola inteira”, afirma Mario. Nesses casos, quem divulga a imagem e todos os usuários que compartilham podem ser penalizados.

Se você é daqueles que acha que não é possível identificar a origem das publicações, está enganado, garante o coordenador. Há uma maneira de descobrir de qual celular a mensagem partiu, mesmo que o provedor de internet não tenha um registro dos envios. “Existe uma forma para provar que a pessoa compartilhou”, frisou. 

De acordo com o coordenador, muitas investigações, no entanto, acabam sem um desfecho, pois as vítimas desistem da denúncia com vergonha de serem expostas.

Educação

Não deveria ser assim mas, em muitas situações, a escola pune os estudantes que têm fotos privadas divulgadas. Para tentar evitar esse tipo esse tipo de problema, o MP realiza palestras com diretores, professores e alunos. “Nós constatamos que a escola não sabe lidar com o evento cibernético”, afirma Mario. 

Ele destaca que, nessas oportunidades, a coordenadoria explica como a internet tornou-se uma extensão da vida pessoal. Assim, os alunos compreendem porque não podem ter determinados tipos de atitudes no ambiente virtual. 

O coordenador ainda defende que uma criança não deve ser penalizada por esse tipo de situação, que exigiria dela muito mais maturidade.

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