O que precisa mudar? O Hoje em Dia fez essa pergunta a quem sofre racismo no Brasil

Thiago Prata
@ThiagoPrata7
28/06/2020 às 07:26.
Atualizado em 27/10/2021 às 03:53
 (Divulgação)

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Muito se discutiu sobre racismo nas últimas semanas, desde o assassinato do norte-americano George Floyd, negro, por um policial branco. Pouco mais de um mês após a morte de Floyd, que foi estopim para manifestações por todo o mundo, inclusive no Brasil, a questão é: o que sairá de concreto das manifestações e quais mudanças reais acontecerão nas vidas de quem ainda convive com a herança deixada pela escravidão. Para quem sente o racismo na pele, o que é preciso mudar?

Variam as idades, profissões e experiências pessoais, mas um consenso está presente nas respostas daqueles que lutam contra o preconceito: só haverá mudanças quando o racismo deixar de ser um problema de negros para se tornar uma questão de toda a sociedade. 

Mobilizações

O professor de Ciência Política da UFMG Cristiano Rodrigues, que estuda os movimentos negros na América Latina, vê uma alteração do quadro do movimento antirracista a partir da morte de Floyd.“Aqui no Brasil tivemos vários exemplos, como o assassinato do João Pedro, antes do Floyd, e tantos outros, em que houve comoção na mídia, mas foi algo limitado. A alteração a partir do Floyd chegou ao Brasil, e vimos isso. Dois ou três domingos atrás, aconteceram manifestações antifascistas, acompanhadas das antirracistas”, comenta.

O sociólogo e cientista político Rudá Ricci também destaca algumas características do movimento atual: “Houve a entrada das torcidas organizadas de futebol. Nestas torcidas, está o povo que vem das periferias dos centros urbanos e que possui trabalhos precários”.

Negacionismo e brutalidade

Cristiano Rodrigues enfatiza que dentro da questão do racismo existe o negacionismo. “Há uma tendência no Brasil de negar o legado da escravidão na sociedade brasileira. E o país criminaliza a pobreza”, aponta.

Há ainda o encarceramento em massa. “Hoje 60% dos detidos no Brasil são negros”, destaca.

De acordo Ricci, diante deste cenário, as manifestações e mobilizações devem seguir a mesma toada das últimas semanas. 

“Pouco a pouco vamos tendo uma reação para que possamos construir uma humanidade mais igualitária, e que as pessoas que hoje estão às margens estejam, a médio prazo, na pior das hipóteses, no centro da política pública no Brasil”, analisa. 

COMO COMBATER O RACISMO

O Hoje em Dia perguntou a algumas personalidades o que é preciso fazer para combater o racismo nos dias de hoje. Confira o que eles disseram.

Elza Soares, cantora e compositora

“Eu acredito em tudo, e que tudo passa. Acredito no poder das vacinas, e essa vacina contra o racismo vai sair também. Acredito que um dia vai acontecer isso, vai ter uma vacina boa contra isso. Vacinar o mundo contra isso.”Divulgação

Rubens Giaquinto, escritor, ativista e músico
“O racismo é uma das grandes mazelas da sociedade, principalmente no Brasil, onde a escravidão durou 400 anos. E para a gente erradicar o racismo, temos que envolver toda a sociedade nessa luta: brancos, negros, mulheres, pobres, ricos, jovens, idosos... E ter muito investimento em educação. Precisamos ter cotas em universidades e serviço público e uma comunicação na grande imprensa para falar sobre questões raciais. Porque o racismo no Brasil é estrutural. Nós temos que combater o racismo na educação, na televisão, na internet e por todos nós para construir um mundo muito melhor para vivermos e sermos felizes.”Divulgação

Roger Deff, músico e jornalista
“Racismo é incompatível com a ideia de uma sociedade que se diga democrática. O racismo interfere no direito de ir e vir, no direito de existir, no direito à vida. Se a gente quer de fato ser um país melhor, a gente precisa entender primeiro que o racismo é inadmissível. E que precisamos colocar a pauta antirracista como pilar essencial da luta pela democracia, pelo direito à vida, por todos os direitos que a gente luta todos os dias. Sejamos antirracistas.”Divulgação

Elizeth Gomes, musicista e cantora lírica
“Eu acredito que o racismo surgiu na formação da mentalidade do povo brasileiro. Uma questão estrutural, que afeta diversos âmbitos da nossa sociedade, como temos visto nas mídias contemporâneas. Passei por muitas situações constrangedoras de racismo e preconceito na trajetória de construção da minha carreira. E creio que para amenizar a ação do racismo em nossa sociedade é necessário que se desenvolvam ações políticas pela educação, cultural, social e pela economia a fim de transformar essa mentalidade construída há muitos anos do nosso povo brasileiro.”Acervo Theatro Municipal do Rio de Janeiro

Débora Helena, consultora financeira e engenheira civil
“O racismo foi construído ao longo dos anos, e não vamos conseguir acabar com isso de um dia para o outro. Primeiro, estude sobre o racismo estruturado, por que isso impacta em nossas vidas hoje. Segundo, faça o teste do pescoço, vire para um lado e para o outro nos lugares que você frequenta e observe quais são as pessoas que estão te servindo e qual a cor das que estão se divertindo. Terceiro, pare de fazer aquelas piadinhas racistas que eu sei que você faz quando está sozinho com seus amigos e sua família. Quarto, pare de ficar dizendo que nós somos todos iguais; nós não somos. Quinto, entenda que meritocracia não existe. Sexto, pare de dizer coisas racistas como ‘mulata’, denegrir’ e ‘criado mudo’, essas coisas são péssimas. Sétimo, se você vai dizer alguma coisa começando com ‘ah, não sendo racista’ ou ‘eu não sou racista, mas...’, é melhor não dizer. Bônus: pare de dizer o que é racismo se você é branco.”Arquivo pessoal

Flávio Renegado, músico e ativista
"Estou passando para lembrar a necessidade de a sociedade entender que a luta contra o racismo não é só do povo preto, mas sim de todos nós. Enquanto não unificarmos o discurso para eliminar esse mal em sua essência, nós não vamos conseguir evoluir enquanto sociedade. Não basta só não ser racista, é necessário ser antirracista. Para isso, a gente conta com a luta de todos e todas para podermos mudar esta realidade."Denise Ricardo/Divulgação

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