Ser atleticano

08/10/2016 às 11:46.
Atualizado em 15/11/2021 às 21:09

Ser atleticano é como, imagino, botar um kipá ou virar maçom. Existe uma sensação de comunidade, de pertencer a um clã, mesmo que apenas no calor de um jogo ou na mesa de um bar. As diferenças – sociais, econômicas, partidárias – desaparecem, com todos falando a mesma língua. Rico ou pobre, petista ou tucano, não há sotaque em se tratando de futebol. 

Os gestos e as palavras são os mesmos, entre a vaia e o grito de gol. Ninguém comemora com outra expressão que não enchendo o peito de alegria e um “gol!!!!” que sai quase involuntariamente da garganta. No atleticano, essa sem cerimônia faz parte do dia a dia. Há um prazer nato no olhar a camisa de um desconhecido e reconhecer o escudo, as cores e até os patrocinadores nela escritos. 

É como, mal comparando, um atestado de bons antecedentes. Você não precisa saber a procedência, para onde vai ou de onde partiu. Importa a comunhão do sentimento. Basta sair do estádio, após uma vitória, e buzinar para ver se outros não farão o mesmo, saudando-o. Logo temos um sinfonia de puro êxtase, com o “fon-fon” representando um cumprimento, um “toca aqui”.

Nunca mais vi o cirurgião, atleticano fanático, que escapou de um hotel ecológico, deixando familiares nos chalés, em direção a um ponto mais alto da região para sintonizar uma rádio que transmitia o jogo na Libertadores. Dessas proezas que só um atleticano é capaz de fazer, como se voltasse no tempo e se tornasse criança mais uma vez, divertida com a travessura.

Gustavo, que lançou o meu livro “Sempre Acreditamos”, conta do dia em que pegou o avião e levou um susto quando o piloto, naqueles protocolares avisos da cabine, não só o identificou pelo nome, em alto e bom som, como também lhe parabenizou pelo triunfo atleticano do dia anterior. Provando assim que tem atleticano em todo lugar, na terra, no mar e no céu.

Basta ver uma transmissão qualquer, da coroação da rainha à passeata contra a saída da Inglaterra da zona do euro, para notarmos uma camisa alvinegra em meio à multidão. Independentemente da ocasião, ela se fará presente, como uma segunda pele. Eu não tenho o manto no armário, mas não preciso vesti-la para as pessoas logo me apontarem como atleticano.

Até parece um desses filmes de ficção científica, em ^que você já nasce com um dispositivo entranhado no seu coração, que o fará para sempre Galo. Atlético no sofrimento que nos acompanhou por tanto tempo e na alegria de ver o time mais uma vez disputando títulos e conquistando a vaga na Copa Libertadores, pelo quinto ano consecutivo.

Posso até queimar a língua, mas ser atleticano hoje é saber que, na falta de um Jemerson, haverá um Gabriel surgindo. Jogadores ávidos por agarrar a sua oportunidade. Quando Fred viu a “rua de fogo” ao chegar no Independência, no ônibus do clube, a reação não poderia ser outra: “1001 coisas que todo jogador deve fazer antes de morrer: vestir a camisa do Galo! Que torcida é essa!!”.

Que torcida é essa!

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