Vladivostok

09/11/2017 às 16:19.
Atualizado em 02/11/2021 às 23:37
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 Para além do jogo de tabuleiro “War”, que nunca gostei, Vladivostok era um mistério. A cidade russa ficou fechada à visitação durante 30 anos, no auge da Guerra Fria. Li sobre ela pela primeira vez nas revistas que eu e o meu cunhado (ainda um colega de escola) pegávamos no Instituto Cultural Brasil-União Soviética, localizado no centro de Belo Horizonte, no final dos anos 80. Não me lembro mais do título da revista nem da rua onde ficava o ICBUS, mas do nome daquele senhor bigodudo que sempre nos recebia eu me recordo.

Éramos comunistas de mentirinha, só para irritar o conservador diretor da escola, onde distribuíamos um jornalzinho clandestino. Marcos era Marcko Vinsky. Eu era só Kiko, por causa de uma colega que tinha esse apelido por parecer com o Quico do “Chaves”. Como era a minha primeira semana na escola e só a conhecia, virei o Kiko. Mas isso é outra história. Por que me lembrei agora da cidade fincada no extremo oriente da Rússia? Porque, durante várias décadas, o Atlético foi uma espécie de Vladivostok.

Você sabia que ela existia e que havia um trem que chegava até lá, o Transiberiano, que, partindo da capital Moscou, percorria quase 10 mil quilômetros ao longo de cinco dias, passando por todos os tipos de cenários e temperaturas. Quem é atleticano das antigas sabe que o itinerário do clube foi semelhante, com tempos de frio e calor, mas a certeza que um título dá nunca veio. Ótimos jogadores como Elzo, Éverton, Gérson, Cléber, Marques e Guilherme desapareceram após um desfecho sempre nebuloso, como uma terra inalcançável.

Vladivostok era – e ainda é – o principal porto russo no Pacífico, onde estão estacionadas as frotas militares nesta região. Está pertinho de China, Japão e Coreia do Norte. Você só a contempla  totalmente entre agosto e outubro, porque nas outras épocas do ano a névoa é tão forte que não dá para enxergar um palmo diante do nariz. Assim como o Galo de hoje, que voltou a ser uma Vladivostok, com jogadores que não conseguem distinguir o gol à frente. Para dizer a verdade, mal estão visualizando o companheiro ao lado.

Alguém pode falar que o Atlético está fora de mão. Para quem não está acostumado, Vladivostok é um perigo. O volante do carro fica à direita, como no Japão e na Inglaterra. Outra armadilha é querer visitar o farol Tokarevsky sob chuva ou frio. Há uma boa chance de acabar embaixo d’água. No porto há um submarino-museu temático da Segunda Guerra, que só satisfaz aos olhos, porque as informações estão todas em russo. E dizer que está tudo russo, no caso do alvinegro, não está longe da verdade.

Vladivostok saiu de trás da cortina de ferro, virou ponto turístico e ganhou um moderno cassino frequentado por chineses e coreanos. Deixou de ser uma das 40 ZATOs – formações territoriais administrativas fechadas, como o Galo de 2012 a 2016. Mas esta condição parece ter retornado agora, não mais como Vladivostok e sim como Chernobyl, que passou a ter acesso restrito após o acidente nuclear de 1986. Não por acaso, a tradução do nome é “folha preta”, possível referência à artemísia, planta calmante. Seria melhor pensar numa urtiga.

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