Dilma e o impeachment

06/04/2016 às 21:45.
Atualizado em 16/11/2021 às 02:50

Antônio Álvares da Silva (*)

O impeachment que corre no Congresso para destituir do cargo a presidente Dilma é o retrato fiel da penúria moral e política em que se encontra o Brasil.

Arranjou-se a desculpa das pedaladas fiscais. O governo financia planos sociais pela CEF, que paga ao beneficiário, com dinheiro do governo, as prestações pecuniárias. Desde o governo FHC houve alguns atrasos no repasse da verba, passando então a CEF a financiar com recursos próprios, o que significa empréstimo ao governo não previsto por lei. Corrigiu-se a irregularidade, reparou-se a falta. Mas só por isso um presidente da República, titular do cargo mais importante da hierarquia administrativa brasileira, eleito com 55 milhões de votos, vai ser destituído? Está clara e evidente a desproporcionalidade da falta com a punição. Portanto, não há justiça no ato.

Um povo se julga pela estabilidade de suas instituições. Qualquer ação que quebre as regras do jogo desmoraliza o país perante o povo e o desqualifica no plano internacional. República de bananas é o que primeiro se ouve.

O governo Dilma teve e tem erros, alguns graves. O partido que a apoiou instituiu no país o maior ciclo de corrupção jamais visto na história brasileira. Mas a presidente foi eleita e a vontade popular tem que ser respeitada. Punam-se os corruptos, corrijam-se os erros cometidos na administração. Mas destituir a presidente por fatos menores já corrigidos é colocar a pena acima do fato punível. Outro absurdo.

Talvez seja Dilma a única representante eleita no Brasil que não tem qualquer mancha em sua vida pessoal. Mas será ela que vai pagar pelos erros dos políticos de todos os partidos?

Fala-se que ela não terá condições de administrar, mesmo vencendo o impeachment. Falso. Agora é que terá plena liberdade de ação, pois está separada da companhia de um partido fisiologista, que estava no governo mais em função de cargos. Por estar agora independente das injunções partidárias, poderá montar excepcional equipe de governo, que vai ajudá-la na condução do país.

Dilma está certa em resistir. Não há de entregar os 55 milhões de votos que o povo livremente lhe concedeu. As instituições democráticas estão em jogo e para defendê-las é preciso coragem que não há de faltar-lhe.

O Congresso deve estar consciente da manobra que está fazendo e do risco a que vai expor o país. Dilma não é Collor. Tem ampla e fiel base de sustentação popular, que já deu sinais visíveis de reação. É melhor seguir a lei e colocar a democracia em funcionamento: o Judiciário punindo os corruptos, a administração funcionando em todos os setores e o Brasil tomando novamente o caminho do crescimento. O respeito às instituições é o maior bem que um país possa gozar.

Se Dilma for deposta, quem vai governar? Quem é este nome? Está oculto ou não existe mesmo? Vamos trocar incapacidade por ineficiência? Quem não subiu ao poder pelo voto popular não há de querer agora subir por elevador, encurtando caminhos e desrespeitando a livre escolha do eleitor.

Se a vontade popular não for respeitada teremos um “fora” para todo presidente que for eleito. “Fora Fernando Henrique, fora Lula” que já houve e agora “fora para Dilma” e também para o próximo. Isto evidentemente não é democracia, mas anarquia e desrespeito à vontade do povo. Por que não aproveitamos a oportunidade para votar um regime parlamentarista em que o primeiro-ministro ou chanceler pode ser trocado sem traumas?

Convém, entretanto, que tomem cuidado. O Poder excessivo tem também seus riscos. A nação em pedaços está aí para provar a afirmativa.

(*) Professor titular da Faculdade de Direito da UFMG

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