Eleição na Polícia Federal

09/06/2016 às 06:00.
Atualizado em 16/11/2021 às 03:48

Antônio Álvares da Silva*

“Government of the people, for the people and by the people” (Governo do povo, para o povo e pelo povo), eis a célebre frase do ex-presidente norte-americano Abraham Lincoln, pronunciada no cemitério de Gettysburg, em 1863. A fala marcou a história dos Estados Unidos e balizou o princípio de todas as democracias do mundo ocidental.

“Governo do povo”, porque nasce dele. “Governo para o povo”, porque a ele se destina e, “pelo povo”, porque é por ele instituído e fundado. Quando mais se puder aprofundar este princípio nas instituições políticas, mais democráticas elas serão.

Além da escolha direta dos membros dos três poderes, outros departamentos do Estado, de grande importância, embora não sejam Poderes da República, vêm procurando democratizar cada vez mais seu quadro diretivo, exatamente para que possam corresponder cada vez mais aos anseios do povo.

Modelos do que falamos estão, por exemplo, na co-gestão, em que empregados participam da gestão da empresa; na direção das faculdades, através de eleição da qual participam alunos, professores e servidores; na OAB há também eleições, e assim por diante.

Todas estas escolhas são conquistas democráticas, já que não se pode fazer eleição geral a todo momento. Além de tomar tempo, seriam insuportavelmente caras. Por isso, realizam-se eleições internas.

O Ministério Público da União tem por chefe o Procurador-Geral da República nomeado pelo Presidente da República (art.28 da Constituição). Para evitar esta escolha unilateral, criou-se na prática a apresentação de lista tríplice, o que favorece e democratiza a escolha do presidente e cria alternativas para uma melhor escolha.

A PF pretende adotar idêntico procedimento que, embora não provenha da lei, é justo e democrático. A lei nem sempre pode dizer tudo. A prática ajuda-a a moldar a vida social. Em votação interna, livre e autônoma, escolheu-se a delegada Érika Marena, que ocupou o primeiro lugar.

Será de toda conveniência que o Presidente da República aceite e valorize esta escolha. Ninguém mais indicado para eleger seus representes do que os colegas de trabalho. Esta conquista deve prosperar até tornar-se regra obrigatória.

A PF é uma instituição que deu certo. É uma das poucas que funciona positivamente. Estas grandes operações, tais como a “Lava Jato”, não seriam possíveis se não fosse a atuação oportuna, tecnicamente correta e rápida da PF, onde tudo começou, propiciando ao MP e ao Judiciário atuar também de modo decisivo e eficaz, com rigor mas com resguardo dos princípios democráticos.

O poder público tem a obrigação de valorizar a PF. A começar pelo salário de seus delegados que devem equiparar-se ao dos juízes federais e dos procuradores. Estas três unidades – PF, MP e Judiciário – agem unitariamente. Logo não deve haver diferença salarial entre elas. 

Os crimes denunciados até agora envolvem pagamento de propina de cerca de R$ 6,4 bilhões, sendo que R$ 2,9 bilhões já foram recuperados. É possível que, a final, quase tudo volte aos cofres públicos. Não há prova mais evidente do êxito da atividade.

Imagine-se a vantagem para o erário e para o país se toda corrupção tiver o mesmo destino. Há ainda o efeito admoestador da pena, quando a norma é desrespeitada e a punição é imediatamente aplicada. Quem quiser praticar corrupção vai pensar duas vezes, pois o erro será apurado e as consequências legais pesarão sobre os ombros do infrator. 

Não é fácil atingir-se um nível de excelência na atividade policial, em que a corrupção ronda frequentemente a atividade dos agentes. É assim em todo o mundo. Só mesmo com pessoas vocacionadas para a função é que se adquire um alto de perfeição. E isto a PF vem demonstrando com suas investigações.

Se nossas instituições policiais, do MP e judiciárias reagirem a todos os crimes como agora se faz com a “Lava Jato”, o país será outro. Somos capazes desta grande mudança.

(*) Professor titular da Faculdade de Direito da UFMG

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