O retrocesso da Lei de responsabilidade das Estatais

02/08/2016 às 20:29.
Atualizado em 15/11/2021 às 20:07
 (Editoria de Arte)

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Lucas Ribeiro Horta*

O Brasil é hoje reconhecido mundialmente pelo alto grau técnico de seus sistemas de engenharia e pela a qualidade de seus empreendimentos. No entanto, a falta de planejamento é um gargalo que já vem se arrastando há décadas, refletindo em um número assustador de obras públicas tocadas sem o direcionamento de um projeto executivo bem detalhado. Trata-se de um erro lamentável, que compromete a qualidade dos empreendimentos entregues à população, aumentando a probabilidade de falhas e até colocando vidas em risco. 

Mesmo após incansáveis manifestações do Sinaenco e de diversas outras entidades do setor de infraestrutura para que o governo vetasse o uso da “contratação integrada” como modalidade de licitação, a prática da realização de licitações de obras públicas sem projeto foi autorizada em definitivo pelo Governo Federal, por meio da Lei de Responsabilidade das Estatais. De fato, a lei, segundo o presidente em exercício, Michel Temer, tem caráter moralizador no sentido de estabelecer regras mais rígidas para nomeação de presidentes, diretores e integrantes dos conselhos de empresas estatais. 

No entanto, o texto não traz inovações em relação ao regime de contratações, permitindo que as estatais e empresas dos diversos níveis de governo contratem obras e serviços de engenharia sem projeto. 

A “contratação integrada” segue a linha de outras regras já praticadas, como a Lei 8.666/1993 e o Regime de Contratação Diferenciado (RDC), criado em 2011 para compensar os atrasos das obras da Copa do Mundo de 2014, e depois estendido para outros programas, como o PAC. Neste, o único e exclusivo objetivo seria diminuir prazos de contratação, uma vez que apenas o anteprojeto de engenharia é fornecido a empresa licitante (ou consórcio). 

O decreto que fixa as regras do RDC já foi considerado inconstitucional pelo Tribunal de Contas da União. Nesse modelo, o governo abre mão de saber o que está comprando. As empresas, por sua vez, entram para o jogo no escuro, sem um diagnóstico correto (sondagem, topografia, questões ambientais e fundiárias da obra), o que não permite a otimiza-ção de custos e prazos. 

Além de prejudicar a segurança jurídica dos investimentos, a contratação simplificada abre margem para o estabelecimento de acordos fraudulentos. Isto porque, apesar de estabelecer a possibilidade de realização de pregão eletrônico para combater o cartel, ambiguamente, um outro artigo do texto dá ao gestor da estatal a opção de não estabelecer disputas dessa forma, desconsiderando, mais uma vez, aspectos concorrenciais de mercado. 

Assim, continuamos chamando a atenção para a necessidade da contratação do projeto executivo em licitações. Trata-se de um importante documento, considerado pelos profissionais da área como um “manual de instruções” da obra e, muito além disso, um instrumento de combate à corrupção. Negligenciá-lo implica num verdadeiro atentado contra a gestão pública, perda de competitividade e um retrocesso no desenvolvimento tecnológico e científico em nosso país. 


(*) É presidente do Sinaenco-MG e presidente da Cappe Brasil Engenharia Ltda.
 

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