Os artistas do impeachment

29/04/2016 às 21:42.
Atualizado em 16/11/2021 às 03:12

Aristóteles Atheniense (*)

É inegável que a presença do povo nas ruas, aguardando o resultado da votação na Câmara dos Deputados, resultou num fato expressivo. No passado, os brasileiros somente vibravam na realização da Copa do Mundo, como se o coração da Pátria estivesse nas chuteiras de nossos craques, segundo Nelson Rodrigues.

Com o passar dos anos, a coisa mudou, sem que o fracasso conhecido no 7 a 1 haja sido o único fator que nos levou a pensar diferente.

Já em 1992, ao longo do processo que antecedeu a queda do presidente Fernando Collor, a nossa gente passou a saber da existência do Supremo Tribunal Federal e dos nomes de alguns ministros que seriam responsáveis pelo julgamento do “caçador de marajás”. 

Nos Estados Unidos, onde o povo sempre esteve sintonizado com o Judiciário, isso nunca foi novidade; mas, no Brasil, saber que contávamos com onze ministros que definiriam a sorte de um presidente, tornou-se algo inédito.

Há quinze dias, só se cogitava de um tema: o impeachment. Este dividiu o país, fazendo lembrar o muro de Berlim, instituindo uma divisão entre os “torcedores” na Explanada dos Ministérios, em Brasília, providenciada para evitar conflitos mais graves.

Inobstante os exageros havidos nas declarações de voto, numa Câmara de Deputados carente do respeito existente no antigo Palácio Tiradentes, no Rio de Janeiro, sou levado a aceitar o que ocorreu naquela Casa.

O que se viu naquele acontecimento foi o esforço desmedido de congressistas e acompanhantes em ganhar espaço na televisão, com o envio de mensagens a parentes e vizinhos, como se estivessem praticando um ato patriótico que lhes asseguraria prestígio e renome no futuro em suas cidades.

Que não dizer da figura “austera” de Paulo Maluf, bastante compenetrado, bem diferente do que sempre foi ao longo de sua trepidante vida pública?

Quantas não foram as agressões verbais dirigidas ao então condutor da votação, presidente Eduardo Cunha, que ficou impassível aos ataques recebidos, optando por implorar a proteção Divina em favor do Brasil?

A esta altura, diante do resultado obtido, já se cogita de sua “salvação”, num movimento que ganhou fôlego no Congresso. 

Entre tantas piruetas, salvou-se o palhaço Tiririca, que ganhou fama em sua primeira eleição ao adotar como lema que, com Tiririca na Câmara, “o Brasil pior não fica”.

Ante a presença de tantos fanfarrões e das bravatas abundantes, fiquei a pensar: qual terá sido a impressão de quem estava no exterior assistindo a este maná de impropérios, sem entender como podia caber tanta vulgaridade num Congresso Nacional, em um dia de tamanho significado para o nosso destino?

Não seria de se estranhar que algum telespectador chegasse a admitir que estivéssemos vivendo um segundo Carnaval em pleno mês de abril, mesmo sem contarmos com fantasias e a nudez tradicional que atrai os turistas.

Mas, apesar de tudo isso, alguma coisa pode ser aproveitada. Excluídos os excessos, vivemos uma semana de incontida politização, mesmo com troca de opiniões e ofensas pessoais. 

É certo que nesse expediente sobejaram esperteza, maquiavelismo, sagacidade, de todo gênero. Mas como essas nódoas poderão ser eliminadas com o tempo, com a chegada de novas gerações mais conscientes e responsáveis, somos obrigados a admitir que a experiência do dia 17 de abril, com todos os seus pecados, não foi em vão. 

Vale assinalar que a democracia não é obra de santos, mas de pecadores, que poderão ainda se redimir de suas culpas e, quem sabe, encontrar um lugar no Céu. 

Resta esperar.

(*) Advogado

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por