Sabedoria do Centro

01/10/2021 às 16:30.
Atualizado em 05/12/2021 às 05:59

Márcio Coimbra*

As eleições gerais na Alemanha mandaram um recado para o mundo. Em meio a uma sociedade pacificada, que passa ao largo dos radicalismos políticos, enxergamos mais uma vitória do centro. Este equilíbrio foi fundamentalmente construído pelo acerto entre os dois grandes partidos do país – CDU, democratas-cristãos de centro-direita, e SPD, social-democratas de centro-esquerda –, que se acertaram em um condomínio político de resultados.

O povo alemão entregou a vitória ao SPD, adversário da CDU – que comandou as coalizões governamentais nos últimos 16 anos. Entretanto, ao contrário do que se imagina, isto não foi uma derrota para a CDU, uma vez que a campanha do SPD foi baseada na continuidade do governo Merkel, que hoje possui como homem forte e ministro da Economia, Olaf Scholz, líder dos social-democratas. No curioso condomínio de poder alemão, convivem centro-esquerda e centro-direita. Um exercício de virtuoso convívio político e democrático no Bundestag.

A convergência entre os dois grandes partidos alemães nos indica que o país tem mostrado maturidade ao lidar com os radicais que tentam subtrair o poder de forma populista, seja pela direita ou pela esquerda. O centro entendeu que seria mais importante encontrar suas convergências do que duelar por suas diferenças. Nesta briga entre os dois, certamente ambos sairiam derrotados. Talvez este seja o grande legado que Angela Merkel deixa para sua geração política.

Enquanto a Alemanha encontra seu caminho, outras nações vivem um clima conflagrado de polarização. Vemos diversos países atingidos por este movimento, que chegou ao Reino Unido, Estados Unidos, Brasil e outras diversas nações que hoje valorizam mais suas diferenças do que aquilo que os une. Talvez por ter sido tão duramente atingida pelo vírus do populismo no passado, a Alemanha saiba dos enormes custos que advêm destas aventuras com líderes autoritários e autocráticos.

Se os bons ventos soprados da Alemanha se espalharem pela Europa, certamente veremos uma reacomodação de forças em diversos países, inclusive com a convergência governamental entre centro-esquerda e centro-direita. Em breve os franceses terão eleições gerais e, considerando o sistema parlamentarista europeu, esta acomodação pode atingir aos poucos diversos outros membros do bloco.

As chances de vermos a mesma coalização de Merkel, mas com Olaf Scholz no poder e a CDU ocupando a vice-chancelaria e a pasta da Economia são possíveis e reais. Os dois partidos sabem que podem entregar uma administração estável, de cunho centrista, com renovação social-democrata em alguns pontos, mantendo os traços de moderação, cautela e prudência que caracterizam os conservadores democratas cristãos. Um condomínio de poder reinventado com uma renovação natural de algumas peças.

*Presidente da Fundação Liberdade Econômica; ex-diretor da Apex-Brasil e do Senado Federal; cientista político, mestre em Ação Política pela Universidad Rey Juan Carlos, Espanha.
 

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