Inversão de valores no Cruzeiro

20/07/2016 às 08:08.
Atualizado em 16/11/2021 às 04:23

Paulo Bento gosta da marcação pressão, avançada, no campo do adversário. Eu também. Mas se apegar a isso – ou a qualquer preferência estratégica – de modo a preterir a técnica, a qualidade dos jogadores em patamares acima de qualquer bom senso, claro, é um erro. Equívoco este que, para sorte de Bruno Ramires, e azar dos cruzeirenses, tem acontecido muito. Sabe aquela história de que o bom treinador deve, acima de tudo, se adaptar ao elenco que possui, escolher sistema, estilo e filosofia condizentes com o plantel? Pois é... Não digo que Bento seja um mau técnico; mas em muitos instantes, o que ele tem feito é querer impor suas ideias independentemente de elas combinarem com as melhores peças a serem selecionadas – ou até sem tentar para valer a execução destes pensamentos com futebolistas que, teoricamente, a priori, não possuem determinadas características, mas que, quem sabe, poderiam se adaptar, surpreender...

O Cruzeiro, com o português, variou, basicamente, entre três sistemas: o 4-1-4-1/4-3-3, o 4-4-2 com losango no meio – utilizado com a escalação inicial diante do Fluminense – e o 4-2-3-1. Nos dois primeiros citados, tem-se um trio de meio-campistas, de volantes; um mais preso, dois com liberdade maior para avançar. Quando escolhe um destes esquemas, Bento normalmente vem pedindo para essa dupla de volantes mais adiantados sair para o combate, subir a marcação, apertar a saída de bola do adversário. Para um jogador sair do meio, e chegar ao ataque para incomodar os defensores/volantes inimigos, em geral, ele precisa de velocidade; para recompor caso esse combate inicial não seja o suficiente para roubar a bola do oponente, então, nem se fala. Muito da escolha por Bruno Ramires – e do desprestígio de Ariel Cabral – passa por isso. Tanto é que, quando o argentino começou jogando com Bento – diante do Vitória pela Copa do Brasil, e do Atlético-PR –, atuou como primeiro volante – algo inédito desde que chegou ao Cruzeiro.

Por esse mesmo motivo, Bento começou com Bruno Ramires e Allano na derrota para o Flu; pelo fato de os dois serem mais rápidos. E sim: neste jogo, Allano foi volante – e não meia-atacante pelas beiradas. Pensando nesse cenário me toco que provavelmente estas tenham sido as verdadeiras razões por trás de uma espécie de inversão – um tanto inusitada – que o comandante celeste fez na partida contra o Botafogo: naquela oportunidade, com Arrascaeta e Robinho juntos, ele escalou o primeiro como “volante pela esquerda” e o segundo como “ponta do losango”, armador principal – quando o natural, o óbvio, seria o contrário.

Tentar entender o que o treinador pensa, estudá-lo, não é com ele concordar. Nossa mídia precisa ser menos simplória, explorar mais profundamente os aspectos técnicos e táticos do jogo, se informar melhor; compreender motivos é importante sim para criticar decisões. Dito isso: nem por um segundo endosso a “obsessão” que Bento tem mostrado por Bruno Ramires – tampouco a escalação de Allano no jogo passado (muito menos como volante que ajuda na construção) e a citada inversão entre Robinho e Arrascaeta. O treinador precisa compreender que – e aqui falo da escolha mais constante e que, portanto, mais interfere na vida do time –, se Bruno Ramires é, de fato, mais rápido que Cabral, é muito inferior, hoje, no todo; que, entre prós e contras, a conta da escalação dele (sob o argumento de que assim subiria a marcação) não fecha, de jeito nenhum; e que, no fundo, além da deficiência técnica geral que tem mostrado, na realidade, convenhamos, nem na marcação pressão Bruno Ramires vem sendo minimamente útil. Bom senso, Portuga, bom senso... Nada de querer “impor” cegamente, a qualquer preço, suas “filosofias de futebol”... 

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