Ponto de virada?

21/01/2020 às 20:01.
Atualizado em 27/10/2021 às 02:22

Há muitos anos os campeonatos estaduais vêm perdendo força vertiginosamente. Além das críticas, das demonstrações de desprezo diretas e extremamente vocais de imprensa e público, existe algo talvez mais representativo, orgânico: um desânimo, uma espécie de indiferença com relação a eles que, na prática, anda se entranhando no mundo do futebol, sendo genuinamente vividos pelas pessoas que pela modalidade se interessam. Vejam bem: aqui não estou entrando em juízo de valor, não avalio se concordo ou não com o fenômeno em tela; mais importante me parece simplesmente se atentar para a realidade, percebermos que não faz sentido gastarmos tantos meses com um produto tão espezinhado por parcela tão significativa do seu próprio universo – seus atores, divulgadores, e potenciais consumidores –, e buscarmos uma solução.

Conversando com atletas de clubes grandes, observo uma mudança na leitura que muitos deles fazem a respeito destes torneios. Nunca os escuto diminuindo peremptoriamente tais competições, mas nas entrelinhas, percebo que vários absorveram uma nuance preocupante – e que denota como a perda de prestígio dos regionais atingiu um patamar que torna impossível ignorar o problema: a não ser em situações excepcionais, que se constroem por uma idiossincrasia qualquer, os jogadores sentem que hoje basicamente não adianta conquistar sucesso coletivo e individual nestes certames. Faturar a artilharia, o prêmio de craque do Mineiro, do Carioca, é um êxito que no restante do ano não se valoriza como tal – e que às vezes até se volta contra o próprio indivíduo: “e, esse aí só joga em estadual...”. Este se mostra um dos pontos que nos levam a questionar: se é para desprezar tanto – a ponto de a coisa praticamente não valer –, por que reservar quase quatro meses para estes enfrentamentos?

Se a queda da relevância concedida aos estaduais, a esta altura, já se prova longínqua, antes rareavam ações sólidas dos clubes que poderiam incentivar transformações práticas. Nesta temporada, alguns movimentos consistentes ameaçam surgir com potencial superior para gerar desdobramentos efetivos, com aquele “quê” de revolucionários. Flamengo e Vasco jogam hoje com times inteiramente desfigurados, tirando completamente o apelo do evento. O rubro-negro, com sua posição de sequer ter começado a treinar com o grupo principal, e com sua firmeza na luta por mais dinheiro da TV – os jogos dos súditos de Jesus não serão transmitidos pela detentora dos direitos do Carioca (pelo menos por enquanto) –, pode ser um dos principais artífices de uma revolução concreta. O fato de o Athletico-PR ter virado case de sucesso no Brasil em diferentes sentidos, menina dos olhos de determinado senso comum e de incontáveis formadores de opinião; o salto de grandeza dado por este clube após dois anos seguidos com títulos representativos – Sul-Americana de 2018 e Copa do Brasil de 2019 –, também contribui; afinal, se antes já se mencionava o Furacão como exemplo de agremiação que tratava os estaduais com um distanciamento mais nítido, mais palpável, hoje estas citações aparecem invariavelmente como um dos motivos para o sucesso da equipe nos embates mais relevantes. Desta maneira, em função de todo o contexto descrito, cresce o coro para que esta atitude seja encarada como modelo a ser copiado.

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