Ciências humanas para quê?

27/08/2020 às 17:04.
Atualizado em 27/10/2021 às 04:23

Léo Miranda* 
lmiranda@hojeemdia.com.br 

Tales de Mileto e Pitágoras são considerados os responsáveis por organizar e sistematizar o conhecimento matemático na Grécia Antiga. O mais interessante é que esses dois grandes pensadores eram na verdade, filósofos. Tales, foi considerado pelo próprio Aristóteles o primeiro filósofo grego, cujo conhecimento adquirido por meio das trocas comerciais com os povos da mesopotâmia foi fundamental no desenvolvimento da geometria. Por sua vez, Pitágoras com base em seu entendimento abstrato e ao mesmo tempo filosófico desenvolveu o seu famoso teorema, que afirma que a soma dos quadrados dos catetos é igual ao quadrado da hipotenusa.

Ainda na Grécia Antiga, Heródoto começou a registrar sistematicamente a história da sua própria época. Ele assim inaugurava de forma organizada um dos principais ramos das ciências humanas, a História. A palavra provém do grego e significa pesquisa, investigação. O historiador é, portanto, um investigador das relações humanas e sociais através do tempo e dos eventos por elas produzido. No contexto atual, muito se indaga sobre a “utilidade” desse conhecimento para a nossa vida, mas sempre com a perspectiva de fornecimento de soluções imediatas perante as mudanças cada vez mais efêmeras produzidas pelo uso da tecnologia, quando na verdade o que esse campo do conhecimento humano faz é fornecer as ferramentas necessárias para uma análise crítica do mundo, das civilizações, etc.

Ao final do século XVIII, o alemão Alexander Von Humboldt ajudou a desenvolver as bases para que hoje conhecemos como Geografia. Suas expedições pela América Central, do Sul e Ásia central resultaram em estudos sobre a geologia e a climatologia dos lugares por onde passou. Sem saber Humboldt contribuía para hoje tivéssemos um conhecimento tão vasto sobre o comportamento dos elementos geográficos e principalmente da maneira como eles se relacionam e impactam as nossas vidas. Para além de Humboldt, o conhecimento geográfico nos permite compreender como o mundo está organizado nas suas mais diversas dimensões, política, econômica, ambiental e social, bem como atuam os atores que produzem o espaço geográfico e de como esses interagem entre si.

Não faz muito tempo que um ataque generalizado e sem embasamento foi iniciado em relação ao ensino de ciências humanas na educação básica brasileira. A despeito de uma pretensa necessidade de valorizar mais as “ciências exatas”, tão importante aos rankings mundiais e do combate a “ideologização” manipuladora. O que na verdade está em jogo nessa abordagem é uma interpretação equivocada da construção do conhecimento, calcada em impressões superficiais e sem embasamento científico. Ao mesmo tempo há o desconhecimento da construção do pensamento nas ciências humanas, que entre outros métodos vale-se da dialética ou confrontação de perspectivas teóricas do mundo em seu processo de desenvolvimento. Diante dos constantes ataques e da desvalorização das ciências humanas, cabe a pergunta: o que seriamos sem elas?

(*) É professor de Geografia, graduado e mestre pela UFMG. Também é fundador do canal educacional Mundo Geográfico.

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