O dia D e a hora H

02/06/2021 às 23:17.
Atualizado em 05/12/2021 às 05:05

Léo Miranda

Trinta e um de maio de 2021, em meio a um conselho de classe com meus pares eis que o silêncio momentâneo é rompido por um brado: chegou o nosso dia, a vacina está disponível para todos os professores! A emoção e a esperança tomam conta de cada um, expressas nas palavras, sorrisos e na expectativa para o que estava por vir: o dia tão aguardado chegou. Logo na manhã seguinte, dia primeiro de junho, acordo cedo e parto em direção ao posto mais próximo. A ansiedade era tanta que apesar da vacinação iniciar-se às 07:30h, às 06:15h eu já estava de pé na porta do centro de saúde, munido de todos os comprovantes solicitados e com misto de emoção e indignação. Emoção por celebrar a saúde pública no Brasil e a ciência, mas indignado por saber que ainda mais da metade da população brasileira terá que aguardar para compartilhar desse dia de celebração e que 463 mil histórias foram encerradas sem a oportunidade que me fora dada.

Após um pouco mais de uma hora de espera (diga-se de passagem, pela ansiedade incontida), sou chamado e com uma breve explicação atenciosa da técnica em enfermagem sobre o procedimento, logo sou vacinado. Assim que saio do local de vacinação, com olhos marejados e coração a mil, me encho de esperança e trato de compartilhar com todos, esposa, família, amigos (principalmente os professores) a satisfação de estar vacinado. Ao longo do dia as mensagens não pararam de chegar: estou vacinado! Relatos emocionados e de desabafo dos colegas de profissão que vivenciaram a partida de entes queridos e que também compartilham a insatisfação com o cenário de negação a ciência e do poder que ela tem de salvar vidas.

Passo o dia em retrospectiva, em meio aos pensamentos e lembranças do início da pandemia e de como viemos parar aqui, em meados de 2021, com 21% da população brasileira vacinada com a primeira dose e 10% com a segunda da vacina. Como pode-se negar a ciência a esse ponto? Como narrativas conspiratórias podem promover esse estrago? Inevitavelmente me lembro da indagação do senador Otto Alencar ao ex-ministro da saúde durante uma sessão da CPI da Covid-19: “como pode alguém defender um remédio que combate protozoários para combater um vírus?” Talvez o motivo dessa pergunta seja reflexo dos tempos atuais, mas também da desconstrução da educação em curso no Brasil. Na era da pós-verdade, dos especialistas das redes sociais, sobram certezas e faltam perguntas que possam realmente produzir mudanças nos rumos do país.

De certo o dia D e a hora H da vacinação, como referido em novembro de 2020 pelo ex-ministro da Saúde em uma fala em plena crise de falta de oxigênio em Manaus poderia ter chegado muito mais cedo, não fosse o descaso e o apoio em argumentos conspiratórios e sem embasamento científico alimentados desde o início da pandemia. Se tem algo que deveria ser precoce no Brasil é o senso de urgência e respeito a ciência e aos cientistas, os de verdade, não os que prescrevem medicamentos de parasitas para combater viroses.

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