O que as queimadas no Pantanal revelam sobre a educação no Brasil?

24/09/2020 às 16:15.
Atualizado em 27/10/2021 às 04:37

Leo Miranda (*)

No dia 19 setembro o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) apresentou dados que revelam que as queimadas no bioma do Pantanal ultrapassaram os quinze mil focos, mais da metade do pior ano já registrado até então na região (2005). Como consequência, aproximadamente 11% da área do bioma (2 milhões de hectares) foi consumida pelo fogo só em 2020, o que resultou em um impacto ambiental sem precedentes na região, com perda de uma parte considerável da flora e fauna desse patrimônio natural da humanidade (Unesco). 

Esse cenário de destruição de um bioma brasileiro por queimadas não é muito diferente do mesmo momento de 2019, só que em um contexto diferente, a Amazônia. Naquele ano a maior floresta tropical do mundo perdeu quase 3 milhões de hectares de acordo com o mesmo INPE, o que voltou os olhares do mundo para o Brasil, assim como acontece nesse momento, principalmente pela inércia das ações do Estado brasileiro. Além do descaso do poder público, os cenários de 2019 e 2020 se interseccionam não só pelas queimadas e perdas ambientais sem precedentes, mas também pelo desconhecimento de parte da população brasileira das consequências que a afeta diretamente não só do ponto de vista ambiental, mas também econômico e social. A desigualdade na distribuição da população e a concentração econômica-demográfica na região Sudeste, faz com que os incêndios criminosos no Norte e Centro-Oeste passem desapercebidos pelos menos atentos.

Parece haver um desinteresse de parte da população do que as queimadas no Pantanal e na Amazônia ou em que qualquer outro bioma brasileiro promovem. Ele traz à tona um aspecto da própria educação no país, a dificuldade em desenvolver habilidades e competências que permitam a percepção do quão grave são os fatos que vivemos e de como poderíamos e ter “voz ativa” como Chico tão brilhantemente canta em Roda Viva.  Negar ou ignorar os impactos das queimadas de hoje e de ontem é ao mesmo tempo não perceber que elas nos afetam diretamente. Talvez ajam assim aqueles que ainda pensam que o meio ambiente não nos pertence, ou que se queimar hoje cresce amanhã. 

Sem a vegetação as estiagens tornam-se cada vez mais prolongadas, mananciais de água de onde é retirada a água que abastece as cidades sofrem com a escassez hídrica, a agricultura padece pela seca e assim os alimentos encarecem pela menor produção. As hidrelétricas produzem menos energia, o que retorna aos consumidores na forma de uma eletricidade cada vez mais cara. Apesar disso, pensar as queimadas nos biomas brasileiros apenas pelo viés dos efeitos nas nossas vidas é também negar a riqueza ecológica e paisagísticas dessas porções do Brasil, como também que vivemos em um planeta em que somos apenas uma parte, uma espécie entre os milhares que o habitam. É negar que a Terra funciona como um sistema e que se uma das partes parar de funcionar como deveria, todas as outras padecerão. 

(*) É professor de Geografia, graduado e mestre pela UFMG. Também é fundador do canal educacional Mundo Geográfico

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