Quanto vale a vida?

11/05/2021 às 22:32.
Atualizado em 05/12/2021 às 04:54

 Marcelo Batista

Sempre tive em mente que a morte não combinava com o ambiente escolar, até que fui surpreendido aos 12 anos de idade. Lembro, com clareza, que quando estava na 6ª série (hoje chamada de 7º ano), uma aluna da sala ao lado acabou morrendo, logo após a aula de educação física, vítima de um aneurisma. Na sala de aula, nós, os alunos, de mãos dadas, rezávamos pela  colega que havia nos abandonado tão cedo e de maneira tão traumática. Fomos apresentados a essa situação tão triste de uma maneira que foi muito dura para todos nós, no início da adolescência.

Durante muito tempo eu pensava que a morte só entraria nas instituições se fosse assim: um problema de saúde repentino e misterioso, mas alguns acontecimentos mostram que nem sempre é isso que ocorre.  Em 2011, na escola Tasso da Silveira, no Realengo, Rio de Janeiro, Wellington Menezes, um ex- aluno,  matou 12 estudantes e tirou a própria vida. Os tiros que saíram de dois revólveres deixaram ainda 22 feridos. Em 2019, em Suzano, São Paulo, uma escola foi invadida por uma dupla de jovens, que matou cinco estudantes e duas funcionárias da instituição. E na semana passada um episódio semelhante ocorreu em uma creche em Saudades, Santa Catarina, gerando a morte de 3 crianças e 2 professoras, assassinados por um jovem em fúria, que invadiu a instituição com uma faca.

Enquanto valer mais um investimento na picanha de 1.799 reais o quilo ou no apoio dos parlamentares, a morte, acidental ou não, rondará as instituições de ensino

 Muitas dessas situações ocorrem em um contexto de falta de acesso às estratégias para garantir a  saúde mental dos estudantes, algo muito raro nas escolas, principalmente nas instituições públicas. É comum que esses massacres aconteçam por ex-alunos acometidos por traumas diversos em relação à escola onde estudaram, ou até mesmo em relação ao sistema educacional. Um atendimento preventivo de saúde poderia evitar esse tipo de situação e ainda atenderia essa garantia constitucional, presente no artigo 196, que prevê a redução do risco de doença. Mas investir em educação é muito caro e o governo não tem verba para isso, certo?

No final do mês passado, as escolas infantis foram reabertas em Belo Horizonte. E a morte, que não deveria combinar com a educação, começa a rondar novamente as instituições. O inimigo agora é outro. Sabemos que a pandemia é silenciosa, mas pode gerar muito mais mortes do que os diversos atentados ocorridos em outras épocas. Será que as escolas infantis teriam mesmo estrutura para funcionar, mesmo com capacidade reduzida? Até quando a morte vai passar como um trator, levando tudo e todos com tanta ferocidade? Alguns dirão que não há verba para investir nas escolas ou para oferecer internet aos alunos, o que garantiria a permanência de estudantes e professores em casa. Se os recursos fossem devidamente aplicados, sem orçamentos paralelos e com um maior investimento na educação seria mais fácil evitar as tragédias. Enquanto valer mais um investimento na picanha de 1799 reais o quilo ou no apoio dos parlamentares, a morte, acidental ou não, rondará as instituições de ensino.

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