Uma marginalização pedagógica

26/11/2020 às 20:03.
Atualizado em 27/10/2021 às 05:09

Marcelo Batista (*)
mbatista@hojeemdia.com.br

Durante uma parte considerável do meu ensino fundamental estudei em uma escola pública. Até e minha 4ª série, que hoje seria equivalente ao 5º ano, estudava em uma escola estadual aqui mesmo em Belo Horizonte. Naquele contexto, convivia com alunos dos mais diversos tipos: brancos, negros, pobres, de classe média e com diversas características familiares. 

Depois desse período, tive a oportunidade de passar para uma escola particular, algo que era um procedimento padrão na minha família se a condição financeira permitisse. Nessa outra escola passei a conviver com crianças de classe média e alta, todos brancos e com a típica estrutura social da tradicional família mineira.  Na primeira escola aprendi muito sobre a convivência com o outro e sobre a diversidade,  já na segunda aprendi sobre como fazer provas e me preparar para a vida, que na maior parte das escolas particulares era somente um vestibular concorrido.

Por mais curioso que seja, naquele momento eu não estranhava o fato de não ter na minha convivência nenhum colega negro. Era como se já fosse naturalizado que somente os brancos teriam acesso às escolas particulares. Era considerado também normal que não houvesse nenhuma discussão sobre a questão racial em sala de aula em nenhum conteúdo, a não ser ao tratar sobre a escravidão, que era aparentemente o único lugar que caberia os indivíduos desse grupo social no ambiente escolar da época.

De lá para cá já passamos por quase vinte anos e infelizmente a distribuição racial nas escolas continua sendo a mesma, e a discussão sobre a questão dos negros também. Mesmo com a lei 10639/2003, que determina o estudo sobre a história da cultura afro-brasileira nas escolas, aparentemente esses indivíduos continuam marginalizados pedagogicamente e ainda mais socialmente. Em uma sociedade que ainda tem preconceitos raciais tão profundos, não me parece estranho também que estejamos passando por uma discussão sobre um homem negro assassinado,João Alberto, no supermercado Carrefour de Porto Alegre. Será que o lugar do negro do Brasil é dentro do supermercado? Ou ainda vivemos uma realidade histórica que só aceita esses indivíduos nas favelas ou nas ruas, que representariam a senzala moderna? 

Infelizmente, creio que toda essa comoção pelo assassinato de João Alberto vá desaparecer com o tempo, assim como a discussão sobre a morte de George Floyd nos Estados Unidos parece parte do passado. Enquanto a questão da cultura negra e o próprio debate racial não estiverem nas escolas de fato essa situação não irá mudar. Enquanto as escolas particulares representarem redutos de pessoas brancas, e os negros estiverem, quando muito, trabalhando nos serviços gerais, essa situação não irá mudar. É necessário mudar as estruturas racistas da sociedade e para fazer isso não dá para esquecer da educação.

(*) Marcelo Batista é educador há mais de 15 anos e fundador do canal Aprendi com o Papai, no Youtube.

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