América Latina para o divã no pós-covid-19

16/05/2020 às 08:03.
Atualizado em 27/10/2021 às 03:31

Com efeitos devastadores em todo o mundo, o pós-Covid será mais cruel em países e regiões em que a desigualdade social é histórica e evidente. Na maioria esmagadora destes, permeiam ainda índices insatisfatórios de democracia real e crises de representação política, com desconexão entre representantes e representados. No caso da América Latina, esses fatores, aliados à polarização política que apresenta a região, indicam que, com o fim do período mais agudo da pandemia, demandas sociais voltarão ainda com mais força, potencializadas pela crise econômica.

Região com 53% do mercado de trabalho informal, segundo a OIT (Organização Internacional do Trabalho), a AL terá efeitos deveras graves e desafiadores do coronavírus. O recente relatório especial da CEPAL, agência da ONU criada para coordenar o desenvolvimento regional, intitulado “Dimensionar os efeitos da Covid-19 para pensar a reativação”, é explícito. Segundo a secretária-executiva da entidade, Alicia Bárcena, “é necessário preparar-se para o mundo pós-COVID-19. Devemos pensar no futuro da região na nova geografia econômica, devido à elevada dependência de manufaturas importadas”. 

O estudo dispõe sobre perspectiva de queda de 5,3% do PIB na região, proporcionando aumento considerável no desemprego. Assim sendo, a taxa de pobreza na região passaria de 30,3% para 34,7%, um aumento de 29 milhões de pessoas em situação de pobreza. Já a extrema pobreza cresceria 2,5 pontos percentuais, passando de 11,0% para 13,5%, o que representa um aumento de 16 milhões de pessoas. O Banco Mundial define pobreza extrema como viver com menos de U$1 por dia e pobreza como viver com até U$ 2 por dia.

Com algumas características similares, cada país tem cicatrizes próprias que deverão ser devidamente tratadas no enfrentamento do deserto social que está por vir, a exemplo das complexas questões políticas de 2019 no Chile, Bolívia e Equador. O grande desafio de todos, mas especificamente no Brasil, será sair do ciclo vicioso da estagnação econômica e do caos social na vida das pessoas. Alto desemprego reflete na diminuição ao acesso a bens e serviços. O consumo das famílias é o principal motor da economia brasileira, correspondendo a cerca de dois terços do PIB. Segundo estudos do Instituto Brasileiro de Economia da FGV, a suspensão das atividades provocará uma contração de ate 8% no consumo das famílias brasileiras. E isto refletirá em descrença no futuro, desagregação familiar, fome, pobreza, aumento da violência, descrédito com instituições públicas e políticas, etc. 

O estabelecimento de um círculo virtuoso tem de início um grande desafio. Mais que polarização, vivemos um ambiente dominado pela intolerância política, o que compromete sobremaneira os debates promissores e efetivos quanto a políticas públicas e demais assuntos de relevância a alcançarmos um desenvolvimento sustentado.

O momento é ímpar e singular. Serenidade e equilíbrio serão a tônica para o complexo labor que está por vir. Todos os setores, sejam públicos, privados e entidades da sociedade civil, terão um papel neste processo que definirá as consequências para esta e as próximas gerações brasileiras. 
 

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