Lula e a insensata comparação de Merkel com Ortega

26/11/2021 às 16:43.
Atualizado em 05/12/2021 às 06:20

Diga que tipo de país defende e direi se tem apreço ou não pelos reais valores democráticos. Um dos maiores desafios da atualidade é fortalecermos a democracia em um mundo em sua maioria desigual, com gravíssimos problemas sociais e com inúmeros casos de sobreposição de interesses pessoais e partidários ao bem comum.

Neste diapasão, digna de reflexão e indignação a declaração recente do ex presidente Lula em relação à alternância de poder mundo afora, em entrevista ao jornal "El Pais". “Por que a Angela Merkel pode ficar 16 anos no poder e o Daniel Ortega não?” Comparar a democracia alemã com a nicaraguense é algo que beira o absurdo, em vários aspectos, seja pelo respeito aos direitos e garantias fundamentais ou às normas nacionais e internacionais, a exemplo da Carta Democrática Interamericana da OEA.

Enquanto a Alemanha figura pelo Índice de Democracia 2019 divulgado pela revista The Economist em 13º lugar, um importante relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA, intitulado “Concentração de Poder e Enfraquecimento do Estado de Direito na Nicarágua”, “aborda a grave crise política, social e de direitos humanos na Nicarágua em um contexto de completo enfraquecimento do Estado de Direito e de uma profunda deterioração em matéria de direitos humanos”.

Dispõe o mesmo que “A concentração do poder pelo Executivo facilitou a transformação da Nicarágua em um Estado policial, no qual o governo instalou um regime de supressão de todas as liberdades, por meio do controle e da vigilância da cidadania e da repressão através dos órgãos de segurança estatais e paraestatais, endossados pelos demais Poderes do Estado e em acordo com as instituições de controle. Não existe no país um sistema de pesos e contrapesos, já que todas as instituições respondem às decisões do Executivo”. 

E mais adiante diz o relatório que: “Também se observou a supressão da personalidade jurídica de três partidos políticos e o contínuo assédio às organizações civis e de direitos humanos mediante o contínuo fechamento do espaço democrático e da imprensa independente. Com tais ações, o governo busca se perpetuar no poder através de eleições que não dão as mínimas garantias de liberdade, acesso à informação, transparência e pluralidade, em um contexto de fechamento de todos os espaços democráticos e de impunidade estrutural”.

Por fim, Daniel Ortega “venceu” nova eleição no início deste mês na Nicarágua para o quarto mandato consecutivo, tendo sua esposa como vice presidente. Para tanto, o “sistema democrático” daquele país prendeu sete dos candidatos com chance de derrotá-lo. A disputa se deu com outros cinco nomes desconhecidos e sem a menor chance de algum êxito.

Já Merkel foi eleita para quatro mandatos consecutivos em 2005, 2009, 2013 e 2017, atuando como primeira ministra da Alemanha. Ela decidiu não se candidatar para mais um período no pleito deste ano. Considerada conciliadora, ponderada e pragmática, liderou os alemães durante a crise financeira internacional de 2008, a crise da Zona do Euro, a crise dos refugiados na Europa, em 2015 e 2016, e durante a pandemia de Covid-19. O governo Merkel teve marcas como estabilidade política, prosperidade econômica e respeito às leis e aos princípios democráticos. 

Cada país tem suas particularidades políticas e econômicas. Características diferentes, problemas singulares e cultura própria. Todos com desafios enormes, sempre devendo ter como foco a qualidade de vida da população, atentando para o interesse público e o bem comum. Importante referenciarmos boas práticas de outros países, tendo a democracia como princípio inegociável.

Para o nosso Brasil, mais de Angela Merkel e nada de Daniel Ortega!

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