Faça o que Digo, Não o que Faço

21/02/2018 às 17:33.
Atualizado em 03/11/2021 às 01:30

Os políticos que se propõem a ter um discurso liberal no Brasil não praticam o que pregam. Recentemente, tivemos demonstrações disso ao ver um político profissional como o prefeito de São Paulo, João Doria, e um “protopolítico”, o apresentador de TV Luciano Huck, ficarem numa saia justa com a revelação de que compraram jatinhos particulares a partir de financiamentos subsidiados pelo contribuinte, obtidos junto ao BNDES.

Não há nada de ilegal nas operações feitas pelos dois. Todavia, soa extremamente contraditório que indivíduos que têm um discurso público de defesa de políticas liberais pró-mercado façam uso do tipo de expediente que fizeram. É mais um caso a demonstrar que, para a elite econômica nacional, o estado mínimo é para os pobres. Na prática, o estado deve ser forte e rico para ter capacidade de transferir renda dos pobres para eles próprios. É por isso que, como já demonstrei em minha coluna, numa outra oportunidade, o Brasil é o único país do mundo com uma elevada carga tributária e um altíssimo nível de desigualdade de renda.

O rentismo da elite econômica brasileira se revela tanto na dependência do crédito subsidiado e das elevadas taxas de juros nas suas aplicações financeiras, como na aversão ao risco. O capitalismo brasileiro é marcado por capitalistas que não tomam risco, que é sempre assumido pelo estado.

Mesmo no caso do mais competitivo setor da economia brasileira, a agropecuária, o sucesso decorreu, e ainda decorre, do estado. Até a década de 1960, a agropecuária brasileira crescia apenas em função da expansão da fronteira agrícola. Foi a partir da criação da Embrapa, na década de 1970, e da articulação promovida por ela com campi de universidades públicas que a produtividade do setor começou a subir de forma expressiva.

Também chama a atenção a traição de valores liberais por parte daqueles que estão propondo ou concordando com medidas que claramente agridem direitos e garantias individuais, como os mandados de busca e apreensão e de prisão coletivos que estão querendo aplicar na intervenção federal no Rio de Janeiro. Claro que, mais uma vez, apenas contra os pobres. Uma última marca da postura contraditória dos autointitulados liberais brasileiros é a intolerância cultural e religiosa. Muitos exigem que o comportamento alheio se adequa a seus próprios valores.

P.S.: No meio de tantas notícias ruins e retrocessos, a decisão da segunda turma do STF de dar habeas corpus coletivo às mulheres presas que estejam grávidas ou tenham filhos até 12 anos e que não tenham sido condenadas traz esperanças de que nosso sistema de Justiça possa ter valores racionais e humanistas.

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