Os Sujos Julgando os Mal Lavados

31/01/2018 às 20:17.
Atualizado em 03/11/2021 às 01:04

O britânico Michael Young cunhou o termo “meritocracia”, a partir de seu livro “The Rise of the Meritocracy”, em 1958. Seu trabalho foi muito mal compreendido, pois é uma fina crítica a uma nova elite que emergia no mundo ocidental. Em um artigo de 2001, publicado no jornal britânico “The Guardian” (intitulado “Down with Meritocracy”), ele faz um importante alerta ao afirmar que “se os ‘meritocratas’ acreditarem, como são cada vez mais estimulados a acreditar, que suas conquistas resultam única e exclusivamente de seus méritos, eles podem começar a pensar que merecem tudo”.

Foi lastimável a reação de Marcelo Bretas, juiz federal de primeira instância do Rio de Janeiro, à reportagem com a informação de que havia entrado com processo judicial para que tanto ele quanto a esposa recebam o indecente, injusto e ilegal (embora amparada em uma decisão monocrática do Ministro Luiz Fux, do STF) auxílio-moradia, apesar de ambos terem imóvel no município no qual residem. A sua reação nas redes sociais mostra que o Sr. Marcelo Bretas pensa que tem direito a tudo. O céu é o limite!

Além do problema apontado por Young em seu artigo, há questões adicionais no caso da autointitulada “meritocracia” togada. Primeiramente, falta a esta o mérito verdadeiro! O julgamento do caso do tríplex no TRF-4, na semana passada, tornou ainda mais evidente a indigência intelectual média da elite profissional do sistema de Justiça. À limitada capacidade analítica dos desembargadores da oitava turma do TRF-4, somou-se uma comunicação oral de baixíssima qualidade (o relator chega ao absurdo de não saber pronunciar corretamente a palavra “advogado”). Mais demonstrações de que há muito pouco mérito intelectual na “cultura concurseira”.

Em segundo lugar, falta aos magistrados brasileiros autoridade moral. Acredito que a maior parte das pessoas tende a acreditar que os magistrados têm um padrão moral mais elevado do que os políticos. Vou tentar fazer aqui uma análise comparativa com base nos melhores indicadores disponíveis. Levantamentos feitos pelo próprio Conselho Nacional de Justiça mostram que a maioria absoluta dos magistrados brasileiros recebe remuneração acima do teto legal (o número mais baixo que encontrei em reportagens sobre o assunto foi 71%).

Por outro lado, a imprensa noticia que 238 congressistas brasileiros são investigados junto ao STF (o que dá 40% do total de deputados federais e senadores somados). Só há uma coisa na qual os magistrados são imbatíveis: o cinismo! São os sujos julgando os mal lavados!

P.S.: Resultados da última pesquisa do Datafolha, realizada após o julgamento do TRF-4, mostram que o cenário de preferências eleitorais não mudou. O eleitor já percebeu a sujeira do jogo judicial!

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