Batinas versus poder

27/09/2018 às 20:06.
Atualizado em 10/11/2021 às 02:41

Ao primeiro vislumbre, li: “as negras baianas da conjura de Minas”, que lança luzes sobre fatos e a participação de membros do clero na Inconfidência Mineira. Estranhei: “negras baianas?”. Voltei à capa, e identifiquei melhor o título: “as negras batinas da conjura de Minas”, de autoria de Maria de Lourdes Dias Reis, 31 Editora, Belo Horizonte, 2018. Na primeira interpretação, talvez me influenciara o espírito carnavalesco, a que tanto é dado o brasileiro, de todas as regiões, em todas as épocas do ano.

O tema, sob todos os aspectos, é fascinante, existindo sempre alguém pesquisando e escrevendo, de modo que tudo parece novo e atual. A belo-horizontina Maria de Lourdes Dias Reis é mestre em história, professora universitária, escritora e jornalista, e sabe o que faz – e o faz bem. 

Marcos Paulo Souza Miranda, promotor de Justiça, sócio do IHGMG, da Academia de Letras do Ministério Público de Minas Gerais e da Academia Mineira Maçônica de Letras, e Rogério Faria Tavares, do Instituto, da AML e do PEN Clube, fazem a abertura do trabalho. Enfatizam o significado para quem quiser ampliar o saber sobre o mais importante movimento emancipacionista do Brasil, em particular a atuação dos padres que nas montanhas aliaram-se (ou não) ao projeto. 

A autora toma emprestado um trecho do Cônego Raymundo Trindade, no “Breve História do Seminário de Mariana”, que dá destaque à ação dos sacerdotes na busca pela desvinculação de Portugal, sobretudo os mineiros:

“... em todos os episódios marcantes da história de Minas, acha-se o traço memorável de membros do clero, que renunciavam à comodidade de uma vida propícia ao recolhimento, preferindo a ação militante de um nobre e comunicativo civismo à cumplicidade fácil com a prepotência e à tirania”. 

É livro bom de ler para se aprender, até porque personagens não faltam. De forma destacada, participaram da Inconfidência os seguintes membros do clero: Cônego Luís Vieira da Silva, padre José da Silva e Oliveira Rolim, padre Carlos Correa de Toledo e Melo, padre José Lopes de Oliveira e padre Manoel Rodrigues da Costa; de modo menos explícito, padre José Maria Farjado de Assis e Francisco Vidal de Barbosa Laje; além de outros, ouvidos como testemunhas nos Autos da Devassa. Conhecendo-os, enriquece-se em conhecimento sobre a Conjura. 

A presença dos membros da igreja sempre foi muito importante nas Minas, cumprindo o objetivo de expansão da fé e do império, decantada por Camões. Os sacerdotes exerciam seus deveres, não circunscritos à difusão dos preceitos religiosos. A outros afazeres se devotam, tão distantes da Corte e das peias impostas pelos superiores hierárquicos. Levavam vantagens. Já chegaram com apreciável cabedal de conhecimentos, logo almejando “subverter os fundamentos políticos e religiosos da sociedade”, como observou Augusto de Lima Junior. 

Não nos estenderemos na análise do livro hoje. Mas me sinto no dever de repetir o que a autora afirmou, com muita propriedade: “aparentemente esses padres estavam a serviço da igreja católica, mas, na realidade, preocupavam-se muito mais com seus interesses particulares, na ampliação de suas fortunas e de seus bens materiais. Maria de Lourdes recorre ao historiador Kenneth Maxwell, em seu excelente “A devassa da devassa”.

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