Esqueceu-se de Vargas

27/08/2018 às 18:39.
Atualizado em 10/11/2021 às 02:08

Não esperava tão absoluto silêncio dos meios de comunicação do país. Mas aconteceu. Por mais que percorresse as páginas dos jornais ou garimpasse as emissoras de rádio e televisão, não encontrei referências à morte de Getúlio Vargas, embora transcorridos somente 64 anos de seu suicídio no velho Palácio do Catete, palco de episódios marcantes da história brasileira. 

Escritor, jornalista, acadêmico, professor e diplomata, Josué Montello registrou suas impressões na manhã trágica de 24 de agosto de 1954, pouco antes das 9 da manhã, quando Oswaldo Orico lhe telefonou: “o Getúlio matou-se com um tiro no coração”.

Montello confirmou a informação pelo rádio e se sentiu atordoado. Comentou em seu livro “Diário da Manhã”: “de fato ele antecipara que só morto sairia do Catete. E com um tiro no coração, como Raul Pompeia, de quem era leitor e admirador”. Lembrei-me do presidente Balmaceda, no Chile, dando à vida o mesmo desfecho como ato político, objeto de todo um livro de Joaquim Nabuco. O autor do “Diário” registrou que, mais do que uma personalidade política, Vargas era uma figura histórica para toda uma geração. “Todo um largo período de vida brasileira o envolve, e é ele quem domina a cena ainda moço na Revolução de 1939, para continuar a dominá-la ainda agora, já velho, no derradeiro lance de sua biografia. 

Velho? Vargas nasceu em São Borja, RS, em 18 de abril de 1883, filho do general Manuel do Nascimento Vargas e Cândida Dorneles, estudou as primeiras letras com professora particular, vindo aos 14 anos para Ouro Preto, onde já estudavam Viriato e Protásio, irmãos mais velhos.

Nos seus 15 anos de governo criou os ministérios da Aeronáutica, da Educação e do Trabalho, além de uma legislação trabalhista, fundou a CSN, a Companhia Siderúrgica Nacional, em Volta Redonda, a FNM – Fábrica Nacional de Motores e a Petrobras.

O momento era realmente difícil, porque a crise política se instalara, surgindo para mais esquentar o ambiente o poder emergente de Samuel Wainer, diretor da “Última Hora”, e o atentado ao jornalista Carlos Lacerda, na rua Toneleros, onde e quando se executara um oficial da Aeronáutica, além de desmandos atribuídos à guarda pessoal do presidente, chefiada por Gregório Fortunato, trazida da fronteira para a agitada vida cotidiana do Rio.

Montello perguntou: “levou ao extremo as lutas contra adversários? Também é verdade. Sufocou a imprensa, canalizando-a para o culto da personalidade através do DIP? Perfeitamente”. 

A morte de Vargas acirrou os ânimos, temeu-se uma revolução. O episódio gerou consternação. E a verdade é que Getúlio, endeusado por expressivos segmentos do operariado, era como o “pai dos pobres”, enquanto outros grupos o julgavam “mãe dos ricos”.

Deitado em seu ataúde, Vargas deixara um trágico legado; uma advertência candente, em carta: “mais uma vez as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se novamente e se desencadeiam contra mim. Não me acusam, infiltram; não me combatem, caluniam, e não me dão o direito de defesa”. 
E o final: “eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade, e saio da vida para entrar na história”. 

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