Mais um Vargas que cai

24/07/2017 às 06:00.
Atualizado em 15/11/2021 às 09:41

Os jornais do país divulgaram que, no dia 17 de julho último, encontrou-se em Porto Alegre, no apartamento em que residia, o corpo de Getúlio Dornelles Vargas Neto, 61 anos. Matou-se com um tiro na cabeça, quase 63 anos após o suicídio do avô, no Palácio do Catete, naquela manhã jamais esquecida de 24 de agosto, em 1954. O ato final e trágico poderia, talvez, ter produzido uma revolução, consideradas as motivações. A nação estremeceu. 

O Neto, um dos fundadores do PDT, deixou um bilhete, de texto ainda não revelado. Ele administrava os negócios da família e lhe sobreviveu a mulher, servidora pública aposentada, Denise Carneiro, além de quatro filhos de dois casamentos anteriores, um dos quais morava com ele, mas estava em viagem. 

Juntam-se os pormenores. O presidente Getúlio se matou aos 72 anos (no dia do aniversário de outro filho – Getulinho), com um tiro no peito, versão contestada por Virgínia Lane. Manoel Vargas, Maneco, filho do ex-presidente e pai do novo Getúlio, deu um tiro também no peito, aos 79 anos, em 15 de janeiro de 1997, em Itaqui, RS.

O personagem que sai de cena neste sétimo mês de 2017 é lembrado por Juremir Machado da Silva, historiador e romancista, nascido em Santana do Livramento, do outro lado da praça está, Rivera, já Uruguai. 

O autor gaúcho lembra que Getúlio era o primeiro neto do líder da Revolução de 1930. Admirador loquaz do pai e do avô, na medida em que um Vargas possa ser loquaz, era fazendeiro em Itaqui, palmilhando a cada dia as terras dos Vargas. Namorou a política, mas desistiu: sonhava com uma plataforma comum aos partidos sem donos, a ser exercida por quem, graças ao prestígio ou ao carisma, vencesse as eleições”. Carregava consigo no rosto, na testa, no corpo inteiro, o jeito dos Vargas.

Há muito mistério em toda a saga dos Vargas, que se ampliou pela descendência. Maneco, o suicida 2, deixou um texto sobre as mulheres fortes da família, a começar por Dona Candoca, a esposa do general Manuel do Nascimento Vargas, a mãe de Gegê, a matriarca. 

“Tudo se bifurca, novas gerações espalham seus ramos e recomeça o que nunca cessou, a forja da vida, a arte do esquecimento pelo trabalho da reconstrução, com suas lembranças, distorções e novas velhas histórias. Getúlio permanece como um velho urubu a dar sombra e guarida a umas e outras, conciliando o inconciliável e tramando os pontos de um laço cada vez mais esgarçado e comprido”.

Por detrás ou sob tudo, talvez “os rastros discretos ou não de algumas mulheres, unidas aos Vargas por sangue, amor, paixão ou ódio”, como registrou Juremir, referindo-se a um antigo texto de Maneco. A mensagem final do mais novo da família que tão tragicamente deixou a vida pode trazer – ou não – alguma revelação nesse emaranhado de autoextermínios nunca suficientemente esclarecidos, até por motivos compreensíveis. 

Virgínia Lane (eu escrevo a respeito em livro sobre o tema) é peremptória no caso de Getúlio Dornelles Vargas, o que foi presidente do Brasil: “Vou levar para o túmulo o que sei. Eu estava no Catete no dia da morte. Eu sei tudo. Não teve suicídio nenhum. Eu ouvi o primeiro tiro. Entrei no quarto. Getúlio estava de bruços. Morreu com um tiro na nuca. Ninguém se mata com um tiro na nuca. Sei quem foi e não posso dizer”.

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