O Museu e a história

16/10/2018 às 19:46.
Atualizado em 28/10/2021 às 01:17

Emanuel Medeiros Vieira não é adepto do silêncio ao longo da vida. Poeta e prosador, defende a premissa de que “a palavra foi feita para ouvir”, aliás título de artigo assinado por Luiz Paulo Pieri, inserido na edição setembro–outubro de 2017, do Jornal da ANE (Associação Nacional dos Escritores).

Por força de sua posição diante dos acontecimentos, foi vigiado, preso e torturado pelo regime militar. Perambulou por aí e, agora, estacionou em Brasília, mais uma vez, onde curte as dores e o sangue do câncer. Mas não se intimida, nem para.

Pieri define: “Emanuel mostra, descaradamente, com audácia e sem rodeios, o triste destino das pessoas humildes, pobres e achincalhadas pelo sistema desumano que tomou conta do Brasil. Encarna em sua literatura a revolta contra os opressores, os tiranos e os deslumbrados do poder”.

Transcorrido um ano, já setembro de 2018, ele me manda um texto contra “o criminoso e obsceno descaso e desinteresse em relação a nossa memória histórica”. O escritor de Santa Catarina se indigna pela inexplicável e imperdoável destruição do Museu Nacional, no Rio de Janeiro, honra e glória dos brasileiros.

Um novo protesto e entre tantos que ecoaram pelos mais de 8 milhões de quilômetros quadrados de território brasileiro: “as cinzas se tornam parte da paisagem, assim como a pobreza, a sujeira, a violência. Aprendemos a desviar dos miseráveis, a ignorar a podridão das praias, a aceitar chacinas.

Quem vai se importar com um museu quando o fogo da indignação apagar? Espero estar errada”, registrou Mariliz Pereira Jorge. “Um povo sem memória é um povo sem história. E um povo sem história está fadado a cometer, no presente e no futuro, os mesmos erros do passado”, proclamava Emília Viotti da Costa.

O New York Times publicou: “brasileiros choram a perda de um museu e o declínio de uma nação”. Wall Street Journal: “Tesouros do continente em jogo no incêndio de museu do Brasil”. Observou Elio Gaspari, “quem viu as primeiras reações dos hierarcas da burocracia cultural diante da tragédia da Quinta da Boa Vista teve o sofrimento adicional de ser tratado como cretino; incêndio foi um acidente previsível, mas ainda assim foi um acidente. A estupidificação oferecida pelos hiercarcas foi empulhação deliberada”(…). Transferir a responsabilidade para a choldra que paga impostos é pura empulhação”.

Foi a crônica de uma morte anunciada: gambiarras, infiltrações, fios expostos etc.

Para nossos governantes, cultura é artigo de segunda necessidade: algo descartável. O que vale são obras “vistosas”: estádios – hoje às moscas – para a Copa do Mundo. E o Legado Olímpico? Preferem oferecer muito dinheiro para cantores (“Lei Rouanet”, via incentivos), que já são muito ricos o suficiente e não precisam desses recursos, pois já garantem o lucro na bilheteria dos seus shows.

Pagamos o preço do desleixo pela cultura, pela memória nacional. E tudo isso é irreparável. 

A verdade é que temos um país sem presente e sem futuro. Agora: sem passado.

Um dia será diferente?
 

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