O teto prestes a desabar

22/10/2021 às 17:11.
Atualizado em 05/12/2021 às 06:06

Poucas coisas são tão difíceis quanto reduzir os gastos do governo. Pela legislação brasileira, quase toda a despesa pública é de execução obrigatória, e da parcela que caberia ao gestor decidir, a chamada despesa discricionária, boa parte é fundamental para a manutenção da prestação de serviços públicos e possui baixa margem de manobra. Por essa razão, é tão importante controlar o crescimento da despesa.

O problema é que isso é tudo que não temos feito no Brasil.

Entre 1997 e 2016, o gasto público federal cresceu, em média, quase 6% ao ano acima da inflação. Por um tempo, esse crescimento foi disfarçado pelo aumento da arrecadação em razão do crescimento econômico e do aumento da carga tributária, até que esta chegou ao limite. Desde então, temos convivido com a dificuldade de controlar o crescimento da nossa dívida, que passou a apontar para o céu.

Nesse contexto, criou-se, em 2016, o Novo Regime Fiscal, conhecido como Teto de Gastos, que limita o crescimento do gasto público à inflação. Isso significa que o aumento real da despesa em uma determinada área deve ser compensado pela redução em outra. A regra foi fundamental para iniciar o processo de reversão da maior crise econômica de nossa história, em 2017. Mais do que uma regra fiscal, o Teto é um instrumento fundamental para viabilizar o crescimento de nossa economia e combater de forma consistente a pobreza. Mas esse Teto começa a desabar.

Disposição para gastar mais nunca faltou no Legislativo. A imensa maioria dos parlamentares vive disso, afinal. Gastos rendem apoios e votos. E a crise decorrente da irresponsabilidade fica na conta do governo. Por essa razão, é no Executivo, normalmente, que reside a responsabilidade por zelar pelo equilíbrio fiscal. Normalmente.

Diante de sua elevada reprovação, e da cada vez mais improvável reeleição, o governo Bolsonaro parece estar disposto a tudo para tentar reverter o quadro. Em um primeiro momento, prorrogou o auxílio emergencial. Agora, tenta transformar o Bolsa Família no Auxílio Brasil, que atenderia mais famílias e com um benefício maior, de R$ 400 por mês.

Um programa como esse, focalizado na transferência direta de renda para aqueles que mais precisam, é, obviamente, bem-vindo. Porém, uma nova política pública deve vir acompanhada da redução de despesas equivalentes para viabilizá-la. Oportunidades de cortes de gastos não faltam, como supersalários, emendas parlamentares, Fundo Eleitoral e redesenho de políticas ineficientes. No entanto, realocar recursos exige vontade e habilidade política. E, na ausência de ambas, Bolsonaro opta pelo caminho mais fácil: abandonar o atual regime fiscal. Ou, como se convencionou chamar, "furar" o Teto.

E, se o próprio governo está disposto a furar o Teto, não será o atual Congresso que irá impedi-lo.

Pelo contrário. O Centrão e sua boiada aguardam ansiosamente pela abertura da porteira. Até mesmo a oposição já sinalizou apoio à proposta. Lula, que sabe que a medida trará o caos econômico, com explosão do dólar e da inflação, não só manifestou apoio como defendeu um benefício de R$ 600. Ele sabe que os efeitos negativos da crise sobre a aprovação de Bolsonaro serão muito maiores que o efeito do programa. Infelizmente, o presidente parece disposto a arriscar.

Da nossa parte, seguiremos lutando pela defesa da única ferramenta capaz de combater a pobreza no Brasil de forma sustentável: a responsabilidade fiscal. Sem ela, seguiremos eternamente vítimas do constante risco de insolvência, que reduz a credibilidade de nossa economia, gerando aumento do dólar e da inflação, reduzindo o poder de compra, aumentando o desemprego e levando mais e mais brasileiros à pobreza.

O equilíbrio das contas públicas não pode ser confundido com insensibilidade de economistas. Só ele é capaz de garantir o prato na mesa e o bem estar da população. Esse sempre foi e sempre será nosso compromisso.

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por