Quando comecei a estudar direito, ainda no meu primeiro ano na faculdade, li uma frase de um jurista romano que traduzida dizia: “nem tudo o que é lícito (legal) é honesto”. Desde então me irrito profundamente com a resposta padrão de todos os aproveitadores de plantão quando são pegos em situações comprometedoras, mas que não representam crime: “a lei não proíbe”… Essa é a desculpa de quem costumava empregar parentes em cargos públicos, de quem costumava sair do governo para começar a fornecer para o governo, de quem recebia doações de campanha de quem prestava serviços para o poder público…
O problema é que a minha conclusão parece ser diametralmente oposta à que vigorou no Brasil nos últimos anos: isso não é motivo para mais legislação, mas para menos…
Acreditar que a lei é capaz de cercar todas as condutas e corrigir todos os problemas faz com que as pessoas acreditem que não cabe a elas agir de forma adequada, mas que, ao contrário, a lei é que deveria “correr na frente” e proibir a conduta. Não é o prefeito que está errado em comprar remédios superfaturados da empresa do seu concunhado, é a lei que deveria ter previsto que isso deveria ser proibido… O Ministro ter sido advogado de réus em processos no Supremo não está errado, a lei é que deveria ter proibido esse tipo de ato… Uma presidente nomear um ministro apenas para lhe garantir foro privilegiado não é errado, a Constituição é que deveria proibir…
Ter uma sociedade menos regulada nos permitiria mais severidade para julgar a conduta moral de nossos governantes, que não devem e não podem se esconder atrás da legalidade estrita. Devem, ao contrário, ser comandados por um padrão moral irretocável ou, caso contrário, ser enxotados dos cargos que ocupam.
Ao se reservar a legislação para o que importa, para temas centrais, vamos promover, ao mesmo tempo, a valorização do que a lei efetivamente trata e, por outro lado, reforçar a importância de medir o nosso comportamento social por outros parâmetros que não apenas a legislação.
Nnem estou dizendo, com isso, que os temas que listei não devam necessariamente ser legislados; mas quando eles passam a ser tratados junto com a proibição de colocar saleiros sobre a mesa ou a criação do Dia Nacional do Desafio Esportivo, perdemos qualquer respeito pela lei e seus efeitos passam a ser banalizados.
Isso para não falar no “mito” da solução de problemas por leis, que, em regra, só criam mais problemas do que já temos… Basta dizer que nossos parlamentares já quiseram colocar na Constituição que a Felicidade é um direito fundamental… Alguém por aí se sentiria mais feliz por conta disso? Acho que não!