São dois os papeis constitucionais de um vereador: (1) legislar, propondo, discutindo e votando as leis de interesse da cidade; (2) fiscalizar, discutindo e compondo o orçamento e acompanhando sua execução. Ao longo do tempo, um terceiro papel foi se estabelecendo, o de articulação das políticas públicas, negociando as soluções com o prefeito – o que, no entanto, vem perigosamente descambando para uma prática patrimonialista, em que os “detentores do poder” deixam de negociar em prol dos interesses gerais e começam a atuar em favor de seus próprios interesses ou de pequenos grupos que representam.
Desde que cheguei à Câmara de BH venho criticando o fato de que pouco se vota, que as sessões são continuamente esvaziadas e obstruídas, enquanto a pauta é preenchida por temas inúteis como criação de datas comemorativas e definição de nomes de espaços públicos. A resposta, de vários vereadores, é que votar leis não é o único papel dos vereadores. Imaginei que se referiam à fiscalização.
Pois bem. Na semana passada chegou a oportunidade de votarmos a LDO, documento inicial do orçamento. A minha expectativa era de que veria o “outro” papel dos vereadores sendo exercido, criando uma estrutura de fiscalização robusta. Como diria minha avó, “Ledo engano”: foram rejeitadas as medidas de aperfeiçoamento da fiscalização propostas por vários vereadores, dos mais diversos partidos. Em uma discussão tecnicamente desqualificada, superficial e com o uso de falsos argumentos, a base do governo enterrou inúmeras propostas de criação de relatórios de fiscalização ou de divulgação transparente de dados.
Das minhas propostas, duas rejeições chamam atenção. Foram contra a criação de um relatório específico para acompanhamento dos gastos de segurança… (apenas 11 votos favoráveis). Rejeitaram ainda a proibição do aumento de impostos em 2018... (apenas sete votos favoráveis).
O recado, para mim, está dado. A Câmara continua legislando com pouca qualidade e não pretende fiscalizar com profundidade. Outros vereadores vão dizer que estou faltando com respeito aos meus colegas – mas são eles que estão faltando com respeito à cidade.
Sobrou na mesa, para a atuação dos vereadores, apenas a articulação política. Logo ela, que é historicamente a causa e efeito da corrupção, do inchaço do governo e do patrimonialismo deslavado na defesa de pequenos interesses ao invés de grandes políticas públicas.
Se o governo andar bem, isso ocorrerá apesar da Câmara e não em virtude dela. Boa sorte ao Kalil e melhor sorte ainda aos belo-horizontinos – que passam a depender da sorte e das boas intenções do prefeito, sem poder contar com a Câmara.