Guilherme da CunhaAdvogado pós-graduado em Direito Tributário e deputado estadual, coordenador da Frente Parlamentar pela Desburocratização

Um silêncio eloquente

Publicado em 05/12/2022 às 06:00.

A Copa encerrou sua primeira fase com momentos decisivos tanto em campo quanto fora dele.

O protesto dos jogadores alemães contra a decisão da Fifa de punir quem se manifestasse contra a homofobia, sobre o qual falamos semana passada, é um deles. Com as mãos à frente das bocas, mostraram que o silêncio sobre o assunto era fruto de censura e expuseram a hipocrisia da Fifa na luta contra o preconceito que diz fazer.

Um outro protesto, todavia, fez uso justamente do silêncio como sua ferramenta. O mesmo silêncio que associamos à censura, quando forçado sobre os insatisfeitos. O mesmo silêncio que associamos à covardia, quando voluntário e vindo de pessoas que se calam diante da injustiça. O silêncio mais corajoso que já vi.

A recusa dos jogadores iranianos em cantar o hino nacional na sua partida de estreia, em protesto contra a violência praticada contra as mulheres no país, ressignificou o silêncio e chamou a atenção do mundo inteiro para os absurdos que acontecem há anos no Irã e que se intensificaram desde setembro, quando a polícia religiosa do governo espancou Masha Amini até a morte por usar incorretamente o véu. Desde então, protestos se multiplicam no país, como também a brutalidade com que o governo dos aiatolás os reprime.

E a coragem dos jogadores se revela justamente a partir dessa brutalidade do governo. Fontes ligadas à seleção iraniana informaram que após se recusarem a cantar o hino os jogadores foram abordados pelo governo com ameaças de prisão e tortura de suas famílias caso repetissem o silêncio. Um governo disposto a praticar violência contra terceiros, que nada fizeram, para atingir seus objetivos.

O protesto encontrou eco nas arquibancadas, com camisas com o nome de Masha sendo exibidas nos estádios. O governo enviou, então, policiais à paisana para acompanhar a torcida, identificando e intimidando quem tentasse protestar. Após o jogo do Irã contra os EUA, a jornalista Domitila Becker reportou episódios dessa intimidação sendo levada a novo patamar. Os agentes infiltrados passaram a agredir fisicamente torcedores que protestavam e essas agressões foram tristemente toleradas pela polícia do Catar como sendo “um assunto entre iranianos”.

É de se lamentar, mas não de se estranhar, que regimes brutais e preconceituosos se apoiem. É de se estranhar, e muito, que pessoas de esquerda no Brasil e em outras partes do mundo, que dizem lutar pelos direitos das mulheres, também apoiem governos como o do Irã apenas por serem críticos do capitalismo e dos EUA. Acreditam na máxima de que o inimigo do seu inimigo é seu amigo. Não é.

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