Tiago MitraudAdministrador e deputado federal pelo NOVO/MG. É Líder do RenovaBR e dirigiu a Fundação Estudar

Enfermagem, você foi iludida!

06/05/2022 às 15:27.
Atualizado em 06/05/2022 às 15:33

A Câmara aprovou, na última quarta-feira, o PL 2564/2020, que institui um piso salarial nacional para profissionais da enfermagem. Justamente pelo respeito que temos por esses profissionais, votamos contra o projeto. Afinal, se o mesmo virar lei, as consequências negativas serão graves.

A medida geraria uma despesa adicional de R$ 16,3 bilhões, sendo R$ 5,8 bilhões para o setor público, R$ 4,9 bilhões de entidades sem fins lucrativos e R$ 5,5 bilhões nos planos de saúde.

Estados e municípios simplesmente não têm de onde tirar esse dinheiro e, se o piso entrar em vigor, congelarão concursos e investirão menos em insumos e melhorias na rede de saúde.

O setor privado terá que repassar aos preços, o que forçará muitas famílias a cancelarem seus planos de saúde, sobrecarregando ainda mais o SUS.

Em ambos os casos, veremos fechamento de leitos e de unidades de saúde. 

O fechamento de leitos revelará os efeitos nefastos do piso salarial, que levará a renda de muitos desses profissionais a zero, uma vez que tendem a ser demitidos, além daqueles que não encontrarão mais oportunidade de trabalho, especialmente os recém-formados. Diante da falta de vagas, enfermeiros serão forçados a aceitarem vagas de técnicos de enfermagem, técnicos a aceitarem vagas de auxiliares e auxiliares ficarão sem trabalho.

Mas o projeto não é apenas ruim, como ilegal.

Em primeiro lugar porque não estabelece a fonte de financiamento da despesa criada, em desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas, principalmente, porque afeta a remuneração de servidores e a Constituição confere competência exclusiva ao Chefe do Executivo para propor leis que alterem a remuneração de servidores.

Tanto é assim que um acordo costurado entre os líderes determinou que, para evitar que o projeto seja derrubado pelo STF, o mesmo não será enviado à sanção até que se encontre uma fonte de financiamento e até que seja aprovada uma PEC que o “legalize”, praticamente uma confissão.

No mesmo dia em que o projeto foi aprovado na Câmara, a PEC 11/2022 foi apresentada no Senado, criando previsão constitucional para o estabelecimento do piso por lei (no caso, o PL 2564/2020) e determinando que estados e municípios devem cumpri-lo.

Apesar de tantos efeitos negativos e da reconhecida inconstitucionalidade, o projeto foi aprovado por ampla maioria. Foram 449 votos favoráveis contra 12 contrários, sendo 8 do Novo. O resultado pode surpreender quem não está familiarizado com o funcionamento do Legislativo, mas a aprovação do projeto ilustra uma das maiores disfuncionalidades de nossa democracia: a aprovação de projetos com benefícios concentrados e custos dispersos.

No caso, os benefícios estão concentrados nos profissionais da enfermagem concursados, que não podem ser demitidos e, inevitavelmente, deverão receber o piso, apesar de terem que trabalhar em condições ainda mais precárias. Enquanto os custos são dispersos entre toda a sociedade, que pagará a conta, salgada, com o aumento dos planos de saúde, a piora do acesso à saúde e o comprometimento dos demais serviços públicos. O primeiro grupo participou ativamente da tramitação do projeto, pressionou parlamentares e lotou as galerias da Câmara na noite de quarta-feira. O segundo sequer foi ouvido.

Mesmo profissionais da enfermagem que atuam na iniciativa privada não tiveram o mesmo envolvimento que aqueles do setor público. Muitos têm consciência dos riscos aos quais estão submetidos. Ainda assim, uma parte atuou pela aprovação do projeto, iludidos pelas falsas promessas de sindicatos, conselhos e políticos, que não hesitam em usar milhões de profissionais como massa de manobra eleitoral.

Infelizmente, episódios como esse seguirão se repetindo enquanto os pagadores de impostos não se envolverem mais ativamente com a política. Seguirão pagando o preço do populismo dos políticos brasileiros.

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