Léo Miranda (*)
lmiranda@hojeemdia.com.br
Na última semana chegamos à marca dos 100 dias de isolamento (ou distanciamento) social. Essa data apesar de meramente simbólica nos traz muitas reflexões, principalmente associadas às mudanças abruptas que tivemos não só na nossa rotina diária, mas também nos espaços em que circulamos e convivemos. Com a escola não foi diferente.
Professores, alunos, colaboradores e pais, todos separados da noite para o dia desse espaço que mais do que relações acadêmicas resulta das relações humanas. Nele se expressam ideias, intenções, conceitos, metodologias e também emoções. Essas nem sempre verbalizadas, mas vividas na forma que o geógrafo chinês Yi Fu-Tuan chamou de topofilia. Esse conceito oriundo da Geografia, associa o espaço às relações afetivas nele e com ele construídas e constituídas.
A impossibilidade de acessar o espaço escolar ressignificou as relações afetivas construídas nele e com ele, agora não mais físico, mas sim digital ou virtual. Se olharmos o contexto anterior ou mesmo o avanço recente das relações digitalizadas e muitas vezes esvaziadas pela ausência do olho no olho, era de se esperar que a perda do espaço da escola pouca ou nenhuma diferença fizesse. Contudo, o que se viu foi exatamente o contrário.
Era também de se esperar por relações afetivas enfraquecidas, afinal não temos pelo menos por hora o contato físico e o acesso ao espaço de convivência, no caso, a escola. Como professor a angústia do esquecimento, do desinteresse dos alunos cresceu, bem como o medo das mudanças em curso produzirem um choque de apatia generalizada. Entretanto, à medida que ingressávamos no “novo normal”, um novo experimento social forçado passou a operar.
De forma quase que subjetiva as relações escolares ganharam novos contornos afetivos, em especial na relação entre alunos e professores. As aulas passaram a ter um significado mais do que pedagógico, elas incorporaram a empatia como elemento central. Não se trata de romantizar todas as dificuldades geradas pelo ingresso forçado em uma realidade digitalizada, em que principalmente professores tiveram suas cargas de trabalho elevadas ao extremo e na maioria das vezes sem as condições tecnológicas necessárias para tal.
O que se destaca é o fato das aulas no espaço virtual terem de alguma forma aproximado mais do que afastado aqueles que estão do outro lado da tela. Ao que parece a ausência do espaço físico transformou o virtual em lugar de afetividade, apesar de não necessariamente democrático. Não podemos negar a dureza do momento, muito menos os efeitos da desigualdade material escancarada. Contudo, os lampejos de humanidade nesse momento não deixam de ser um alento e uma mensagem de esperança em tempos difíceis.
(*) É professor de Geografia, graduado e mestre pela UFMG. Também é fundador do canal educacional Mundo Geográfico.