EducaçãoLéo Miranda. Do \“Mundo Geográfico\” - YouTube Marcelo Batista. Do \“Aprendi com o Papai\” - YouTube

Desescolarizados

Publicado em 07/04/2022 às 06:00.

Léo Miranda*

O ano de 2022 trouxe o tão aguardado retorno 100% presencial das salas de aulas, depois de meses em ensino totalmente online em 2020 e na modalidade híbrida em 2021. Junto com as salas novamente cheias de alunos fisicamente, vieram as expectativas da retomada do ambiente escolar que vigorava antes do início da pandemia, para ser mais preciso, de como as coisas eram em 2019.

Dessa forma, todos os processos antes consolidados como práticas comuns no passado não muito distante rapidamente voltaram a fazer parte da rotina dos alunos: provas redigidas e não mais digitadas, cadernos e registros da matéria, controles de para casas, projetos e trabalhos, entre outros. Acontece que a escola de 2019 não é mais a escola de 2022, pois parafraseando o filósofo Heráclito, “ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois quando nele se entra novamente, não se encontra as mesmas águas”.

Os ritos foram perdidos, desde abrir o caderno, a fazer anotações, ou mesmo pedir para sair da sala para ir ao banheiro ou tomar água. Sentar-se por horas de frente ao professor tornou-se mais desafiante, quando em casa poderia, até pouco tempo, se levantar a hora que quiser, ou mesmo ter acesso a uma cadeira mais confortável do que a da sala de aula. Ao mesmo tempo, em casa, não havia o colega ao lado, ou mesmo todos os outros colegas em um mesmo espaço, assim as necessidades coletivas eram menos presentes do que as atuais: porque aguardar o colega falar para eu falar, quando o que ele quer falar não me interessa? Por que ouvir o que o professor está falando, quando o papo com o colega está mais interessante?

Alteridade e empatia se perderam em um mar de individualismo reforçado pelo longo período de distanciamento físico. Na mesma intensidade multiplicaram-se as questões emocionais decorrentes do bullying, mais um reflexo da descaracterização da convivência coletiva, do respeito ao outro. Essa questão sempre foi sensível em tempos anteriores ao início da pandemia, mas retornou com mais intensidade nesse momento.

Como se vê, as questões que se colocam ao ensino escolar são complexas e múltiplas, tanto quanto o foram quando do fechamento das escolas. Assim também exigirão tempo e ações que permitam contornar a desescolarização promovida por dois anos sem que o espaço físico e os processos escolares fossem a prática cotidiana. Talvez as mudanças atuais sejam mais estruturais do que conjunturais, o que na prática significa que soluções já conhecidas do passado não trarão os mesmos resultados.

Se lá no início da pandemia já dizíamos que a pandemia catalisaria as mudanças educacionais em curso, não faz muito sentido seguir no caminho contrário, mesmo que esse seja mais confortável e conhecido. A questão que se coloca é como trocar a roda com o carro em movimento, ou seja, como proceder diante do quadro de perda de referência escolar e ao mesmo engajar os alunos, pais e toda a comunidade escolar nesse processo sem que esses se percam no processo.

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