Marcelo Batista
No meu último texto discuti sobre a minha expectativa de volta às aulas presenciais após o período mais rigoroso da pandemia e não posso deixar de confessar: tem sido incrível. É impressionante como o contato humano pode animar o nosso dia, assim como é fantástico perceber que os alunos têm rosto e que muitos deles vão além das imagens das iniciais dos nomes no Google Meet. Passei tanto tempo só no virtual que em determinados momentos até eu mesmo esqueci que existo de verdade. Durante esse período me via tanto “dentro” do computador que era difícil lembrar que tem uma vida muito intensa e pulsante do lado de cá da tela.
Para os que se preocuparam, as pernas aguentaram e os pés também, mesmo que com uma palmilha especial para fascite plantar comprada para absorver os impactos da rotina de tantas aulas. Pude também descobrir (da pior forma) que não existe uma máscara boa para dar aula e que é possível acostumar até mesmo com esse desconforto depois de algum tempo. Aprendemos até a respirar de uma maneira mais suave e a respeitar o novo ritmo imposto.
Que nenhum aluno me leia, mas uma coisa que ainda não consigo aprender é de qual lugar exato vem a voz do aluno, embaixo da máscara, quando ele conversa durante a aula. Dá para perceber de qual região o som está vindo, mas é impossível saber quem é exatamente o meliante nas conversas paralelas. Mas por enquanto não tem nem me incomodado ainda, reflexo da saudade acumulada há muitos meses.
O batidão da volta às aulas presenciais me ajudou a perceber que o segundo semestre já chegou e foi importante para sentir o sangue correndo nas veias, mesmo que com muito cansaço. Aulas, diários, folhas de ponto para preencher, aulas para preparar, provas para corrigir e outras para elaborar, textos para corrigir. No segundo semestre o trabalho não acaba mais. Pelo menos até o Enem, a previsão é de ritmo muito intenso.
Mas depois dos vestibulares tudo se ajeita, dizem. E, enquanto isso, eu e vários outros professores vamos adiando o momento do descanso para depois da prova e para o próximo Enem, que, para nós, professores, é sempre adiado para o ano seguinte. E entre um ciclo e outro vamos vivendo, entre provas e semanas que passam em uma velocidade absurda. Entre sábados letivos e três turnos de aula essa fase da pandemia vai passando e entre mortos e feridos salvaram-se quase todos. Com alguns arranhões, com a saúde mental bem debilitada dos dois lados da tela e da sala, sempre aguardando o próximo ciclo, a próxima prova ou o próximo Enem.
E acreditem: acabei de fechar mais duas aulas nas tardes de sábado, que antes serviam somente para o descanso e o relaxamento, mas não dá pra abrir mão das boas oportunidades. O ano e o contexto são de crise, como recusar qualquer oportunidade de trabalho? Enquanto o Brasil vai afundando, nós, professores, os violinistas do Titanic, continuamos tocando, mesmo que o navio afunde, porque por desespero, amor ou drama, é a única coisa que podemos fazer.