Conteúdo escrito por professores da Nova Faculdade

‘Exposed’ de suposta traição envolvendo padre viola a privacidade?!

Publicado em 29/10/2025 às 06:00.

Vinícius da Costa Gomes*


“Vazamento de vídeo de Padre e fiel!”. As timelines em polvorosa só falam disso, ou melhor, falaram. Afinal, em tempos de comunicação ultrassônica, o assunto desta semana já é outro: a suposta agressão do ator Dado Dolabella à miss Gramado. Bom, vou contrariar o fluxo “normal” e vou com calma, no primeiro caso. De toda forma já adianto, os casos virais tratam de um assunto comum (além de atual e crucial): o “exposed”. Traduzindo, o vazamento de vídeos íntimos nas redes. 

“Prof é a internet! Ela é coisa do demônio! Queimem as redes! O mundo está acabando…” Calma, calma. Não sou adepto dessas teorias fatalistas ou extremistas. Como digo aos meus alunos: na minha humilde opinião, a internet não é um problema em si, mas, de fato, ela amplia o problema. 

Explico: fofoca sobre a intimidade alheia sempre existiu. Só que antes  ela ocorria num ambiente menor, entre amigos ou em uma praça. Por óbvio ela já era um problema e já gerava consequências (inclusive, já aviso aos desinformados que o Código Penal prevê os crimes contra a honra desde 1940). A internet só ampliou e muito esse alcance. Uma pessoa atingida por uma fofoca podia ter dificuldades de conviver no mesmo bairro, mas bastava mudar de bairro (não estou culpando a vítima, não é ela que tem que se mudar, só exemplificando que existia solução). Hoje um vídeo viral eterniza o problema. Infelizmente, já há casos de diversas pessoas que nunca mais conseguiram ter uma vida “normal”. Basicamente, me arrisco a dizer que em qualquer lugar os envolvidos na suposta traição carregarão essa história. Isso por si só já demonstra a gravidade do assunto. Não, não é mera fofoca.

Mas vamos ao caso. O vídeo narra uma invasão a uma casa paroquial para revelar a suposta traição de uma fiel com o padre local. De início, os invasores já cometem um crime, o de invasão de domicílio. A casa é inviolável para proteger o direito fundamental à privacidade. Todos os indivíduos têm direito à privacidade, ou seja, de manter para si aquilo que entendem que só cabe a eles mesmos. A casa é o local em que o indivíduo tem maior proteção. Não importa se o local é parte da igreja ou se é a casa do padre. Afinal, o padre é ser humano e também está protegido. Nesse caso, o ato por si só já viola um direito fundamental e permite uma possível sanção penal (lembrando: temos apenas versões, logo não sabemos dos detalhes para afirmar exatamente algo - o caso é interessante para aprender sobre o “exposed” e a privacidade, sem conclusões precipitadas ou violadoras de direitos).

Além disso, todos os fatos foram gravados ao vivo por alguns dos invasores. Aliás, é esse o vídeo que posteriormente viraliza e ganha as telas e falas de todos os brasileiros. O “exposed” também é uma violação à privacidade. O caso trata-se claramente de uma possível relação íntima, logo protegido pela privacidade. A privacidade é um direito fundamental porque todo ser humano necessita de um ambiente só para si, de preservar aquelas informações que pertencem só a ele. Se for verdade o retratado, temos uma relação íntima, logo, protegida. Aliás, vou além: se dentro da casa paroquial claramente há privacidade protegida, mesmo que não se trate de uma relação íntima entre os envolvidos. Nesse ponto é crucial entender o que é a privacidade e quando ela é violada.

A privacidade é a exigência do indivíduo se encontrar protegido na sua solidão, o direito de estar só consigo mesmo. Ela é uma condição para o correto desenvolvimento da personalidade. A esfera da privacidade visa a fornecer um ambiente de tranquilidade emocional fundamental para uma autoavaliação e revisão de metas e objetivos pessoais de cada ser humano.

Sobre a violação da privacidade, é interessante citar o estudo de Willian Prosser sobre os quatro meios básicos de afrontar a privacidade. O autor afirma que a violação ocorre quando: 1) há intromissão na reclusão ou na solidão do indivíduo; 2) há exposição pública de fatos privados; 3) há exposição do indivíduo a uma falsa percepção do público (pessoa retratada de modo inexato ou censurável); 4) há apropriação do nome e da imagem da pessoa. Veja que a revelação do vídeo violou quase todos os meios de afronta à privacidade, portanto é ilícita. 

Aos leitores fica o aviso: “exposed” não é permitido pela lei e, assim, tem consequências. Esclareço ainda que não se trata de “mimimi” ou de “politicamente correto”, mas de verdadeira proteção aos direitos fundamentais com possibilidade de punição penal. Lembrando que os crimes contra a honra já existem desde 1940, logo não se trata de nenhuma novidade. A internet não é terra sem lei - pode não parecer, mas a lei também se aplica ao mundo virtual.

*Mestre e especialista em Direito. Professor da Nova Faculdade, Promove, Kennedy, Universidade Santa Úrsula e Faculdade Universo. Assessor da Ouvidoria de Prevenção e Combate à Corrupção da Ouvidoria Geral do Estado. Professor online nas horas vagas: @profviniciusgomes (instagram, YouTube, Facebook, TikTok, Bluesky e X)

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