David Braga é CEO da Prime Talent. Professor da Fundação Dom Cabral, Presidente da ABRH-MG, Presidente do Conselho de Administração do ChildFund Brasil e Vice Presidente do Conselho de RH da ACMINAS

Entre facções e feudos internos: lições da guerra no Rio para a governança corporativa

Publicado em 03/11/2025 às 17:23.

O recente episódio no Rio de Janeiro, que terminou com a morte de dezenas de criminosos durante uma operação policial, expôs novamente um dilema que ultrapassa a segurança pública. A ação, considerada eficaz sob o ponto de vista operacional, desarticulou parte de uma facção que impunha medo a comunidades inteiras. Ao mesmo tempo, gerou comoção em parte da sociedade e foi retratada por setores da imprensa como um suposto “massacre”. O caso reacende o debate sobre ética, valores e a complexidade de se analisar um fato sem compreender seu contexto,o que, aliás, se repete no mundo corporativo.

Vivemos tempos em que o certo e o errado parecem trocados de lugar, e onde a empatia seletiva se sobrepõe à racionalidade. No ambiente empresarial, a lógica não é tão diferente: líderes e equipes frequentemente tomam decisões a partir de percepções parciais, sem compreender o todo. Julgam profissionais sem analisar fatos, interpretam comportamentos sem contexto e, com isso, constroem injustiças que corroem a confiança e a cultura organizacional.

A operação no Rio e a rotina corporativa têm em comum a falta de profundidade na leitura dos acontecimentos. Assim como parte da mídia tratou a ação policial de forma reducionista, muitas empresas reagem a sintomas e não às causas. O resultado é a perda de credibilidade, seja de uma instituição pública, seja de uma liderança empresarial. Nas corporações, isso se traduz em decisões apressadas, demissões mal avaliadas, promoções equivocadas e uma cultura baseada em julgamentos rasos. A consequência é clara: ambientes mais inseguros, desengajados e propensos ao conflito.

Outro ponto de convergência está nos valores. A sociedade precisa recuperar parâmetros morais claros para distinguir justiça de impunidade; as empresas, por sua vez, devem reforçar a coerência entre discurso e prática. Não adianta defender propósito e ética nos discursos enquanto se tolera injustiça, favoritismo ou falta de transparência nas decisões internas. A mesma maturidade que se exige do Estado para equilibrar firmeza e humanidade é a que se espera das organizações para unir resultado e respeito.

No campo da segurança pública, nenhuma morte deve ser celebrada, mas é preciso reconhecer a diferença entre proteger vidas e ser conivente com o crime. Da mesma forma, nas empresas, é necessário distinguir empatia de complacência. O desafio é agir com equilíbrio: entender o contexto, buscar a verdade e tomar decisões baseadas em fatos, não em emoções ou conveniências.

Tanto no Brasil real quanto no corporativo, o que está em jogo é a ética como fundamento de convivência e progresso. Julgar sem compreender, atacar sem conhecer, decidir sem investigar; tudo isso mina a credibilidade e impede qualquer transformação sustentável. Seja nas ruas ou nos escritórios, o país e suas empresas precisam de mais profundidade, coerência e coragem para encarar a complexidade dos fatos sem perder o senso de justiça. Porque, no fim, o que está em disputa é o mesmo valor essencial: a integridade.

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