Na economia brasileira, anunciar uma medida já não significa que ela vai durar. O Problema é que, quando as peças não se encaixam, o que sobra é a sensação de que o governo age mais por tentativa e erro do que por planejamento. A recente mudança no IOF, anunciada e parcialmente revertida em questão de horas, é mais um capítulo dessa novela.
Haddad e a arte da (des)calibragem econômica
O ministro Fernando Haddad parece ter confirmado o ritmo da política econômica à brasileira: meio passo à frente, dois passos para o lado, meia-volta e segue o baile. Em entrevista ao O Globo neste fim de semana, ele tratou do recente aumento do IOF como algo "estudado há bastante tempo", tudo com participação e aval do presidente Lula.
O Banco Central? Sim, foi citado. Mas não participou da redação do decreto, nem leu o texto. O que, considerando os efeitos no mercado, talvez seja o novo normal: o órgão responsável pela política monetária sendo apenas espectador da política tributária.
Como se sabe, o mercado não engoliu essa história. Houve recuo na taxação de investimentos no exterior e, quando questionado, o ministro alegou que foi uma decisão "absolutamente técnica", e que não há crise de credibilidade. Em suas palavras: “Quanto mais você dialoga, é franco e humilde, mais constrói reputação.” É um argumento curioso, especialmente considerando que ele havia garantido diversas vezes que não haveria aumento no IOF.
Oposição ataca: o desgaste vai além do IOF
Enquanto isso, em Brasília, a oposição aproveita o momento para relembrar o “imposto das blusinhas” e o caos do Pix. Desta vez, porém, a situação mexe com a credibilidade da equipe econômica, que, convenhamos, já não era das mais robustas. E não podemos esquecer de outra polêmica recente. O deputado Hugo Motta está prestes a escolher o relator de um projeto que promete trazer à tona o caos silencioso dos descontos nas aposentadorias do INSS. A proposta busca rever as regras para o que, na prática, tem funcionado como um “desconto automático” nas aposentadorias. Mais de 2 milhões de aposentados já solicitaram reembolso por valores descontados sem autorização clara.
No exterior, Trump também recua
O presidente Donald Trump, como de costume, voltou a demonstrar preferência pelo improviso em vez do protocolo. Na noite de domingo, decidiu adiar até 9 de julho a imposição da tarifa de 50% contra a União Europeia, tudo após um telefonema com
Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia.
O detalhe curioso é que, poucas horas antes, Ursula já havia anunciado no X (ex-Twitter) que a Europa queria mais tempo para negociar, e que até 9 de julho estaria bom. Trump, então, prontamente atendeu ao pedido, como quem faz um favor pessoal, embora tenha sido pressionado publicamente.
Esse recuo estratégico vem na sequência de uma sexta-feira típica de Trump: ameaças no plural e inimigos renovados. Afinal, toda boa guerra comercial precisa de novos vilões de tempos em tempos. Além da UE, sobrou até para a Apple, com a proposta de aplicar uma tarifa de 25% sobre iPhones fabricados fora dos EUA.
Uma semana decisiva para os juros
A agenda de indicadores está recheada: tem PIB nos EUA e o PCE (índice de inflação americano). Por aqui, temos o IPCA-15 e, também, os números do emprego (Caged e IBGE), além dos dados fiscais de abril, estes últimos em meio ao vaivém das medidas anunciadas (ou quase) no Relatório Bimestral de Receitas e Despesas.
Embora nem sempre pareça, são os dados de inflação que fortalecem as próximas decisões dos Bancos Centrais sobre os juros. Porque entre tarifas improvisadas e dados econômicos sólidos, o mercado ainda prefere o que consegue prever.