A comida como identidade cultural do Brasil

Publicado em 24/10/2025 às 06:00.

Rubens de Avelar Freitas*


Falar da comida brasileira é muito mais do que descrever receitas ou ingredientes. É falar de memória, de encontros, de raízes e da forma como um país inteiro se reconhece à mesa. A diversidade da nossa culinária traduz a mistura de povos que ajudaram a formar o Brasil: indígenas, africanos, europeus e, mais tarde, imigrantes de diferentes partes do mundo. Cada prato típico conta uma história, guarda um pedaço da nossa identidade e reforça a ideia de que comer é também um ato de pertencimento.

Desde as primeiras populações indígenas, que já faziam do milho, da mandioca e do peixe a base da alimentação, a comida ganhou contornos de cultura. A feijoada, símbolo tão associado ao Brasil, é fruto da adaptação de ingredientes africanos, portugueses e locais.

O acarajé, vendido nas ruas da Bahia, não é apenas alimento, mas também expressão religiosa, carregada de significado ancestral. Já o churrasco do Sul revela a herança dos tropeiros e gaúchos, reforçando o valor da coletividade em torno do fogo.

O Brasil é, na prática, um mosaico gastronômico. Em Minas Gerais, a mesa farta com queijo, pão de queijo, feijão tropeiro e café passado no coador remete à hospitalidade. Na Amazônia, sabores únicos como o tucupi, o açaí e o jambu revelam a força da floresta e o respeito às tradições indígenas. No Nordeste, o baião de dois e a carne de sol falam de resistência e criatividade diante do clima árido. E no litoral, a moqueca, seja capixaba ou baiana, mostra como o mar influencia a vida e o paladar das comunidades.

A comida, no Brasil, também é linguagem de afeto. Quantas vezes não lembramos da casa da avó pelo cheiro de bolo saindo do forno ou do domingo em família em volta da panela de macarrão? Esses rituais reforçam o quanto a culinária é capaz de unir pessoas, de atravessar gerações e de preservar memórias. Não é à toa que muitas receitas não estão em livros, mas no “olhômetro” e nas histórias passadas de mãe para filha, de pai para filho.

Nos últimos anos, a gastronomia brasileira tem ganhado mais destaque internacional. Chefs renomados e projetos comunitários têm mostrado ao mundo a riqueza da nossa comida, que vai muito além dos estereótipos. Mas, ao mesmo tempo, ela continua simples, acessível e presente no cotidiano, seja em uma feira de bairro, em uma festa junina ou no prato feito do boteco da esquina.

A comida é, portanto, um elo entre passado e presente. É identidade, memória e celebração. Representa a pluralidade de um país que, apesar das diferenças regionais, se reconhece no prazer de sentar-se à mesa. O Brasil pode ser visto por muitos ângulos, mas é pelo sabor que ele se torna inesquecível.

* Gastrólogo e professor especialista em gastronomia e estudos da culinária

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