Rubens de Avelar Freitas*
Nos últimos anos, uma nova cena tem tomado forma nas principais capitais brasileiras: a dos bares autorais. Se antes o público buscava apenas um bom drink, agora procura também identidade, personalidade e narrativa. Cada bar quer ser mais do que um ponto de encontro; quer ser uma experiência completa, com conceitos próprios e coquetéis que não se repetem em nenhum outro balcão do país.
São Paulo, por exemplo, vive um momento de efervescência criativa. Bartenders transformam ingredientes nacionais em protagonistas, criando bebidas que contam histórias sobre biomas, viagens ou memórias pessoais.
Já no Rio, a aposta tem sido em bares que unem música, gastronomia e coquetelaria, criando ambientes onde o drink conversa com o clima da cidade — leve, descontraído e cheio de bossa.
Em Belo Horizonte, a força vem das casas que valorizam produtos locais e da criatividade mineira em reinterpretar clássicos com sotaque regional. Essa onda autoral surge como resposta a um público mais curioso e exigente. As pessoas querem saber de onde veio o ingrediente, por que aquela mistura existe, qual a ideia por trás do nome do drink. É como se cada criação fosse um pequeno manifesto líquido.
Outro ponto que impulsiona o crescimento dessa tendência é a valorização dos bartenders. Nunca se falou tanto sobre eles, suas trajetórias e suas assinaturas. Muitos se tornaram referência e atraem clientes que querem provar “aquele drink que só existe ali”. Isso cria uma relação de confiança: o público se abre para experimentar e os bartenders se sentem livres para ousar.
Além dos coquetéis exclusivos, os bares autorais trabalham atmosferas cuidadosamente construídas. Tudo importa — o design do espaço, a iluminação, a trilha sonora, o formato do cardápio. A proposta é fazer com que o cliente sinta que entrou em um universo particular, pensado nos mínimos detalhes.
No fim das contas, o crescimento dos bares autorais diz muito sobre o momento atual da vida urbana no Brasil. Em meio à rotina acelerada das grandes cidades, as pessoas buscam lugares capazes de surpreender e, ao mesmo tempo, oferecer acolhimento. E poucos lugares fazem isso tão bem quanto um bar com identidade forte, onde cada drink carrega uma ideia, um gesto ou uma história.
Essa tendência ainda deve crescer — não por modismo, mas porque revela uma vontade coletiva de viver experiências que tenham sentido. E quando o copo entrega mais do que sabor, o brinde se torna parte da memória.
* Gastrólogo e professor especialista em gastronomia e estudos da culinária