Valorização do profissional de gastronomia no mercado de trabalho

Publicado em 05/09/2025 às 06:00.

Maria José Avelino Victória*


A valorização do profissional da gastronomia no Brasil resulta de um processo multifacetado em que convergem fatores midiáticos, educacionais e institucionais. Nos últimos anos, a ampla exposição em programas televisivos, reality shows e, sobretudo, nas redes sociais conferiu ao chef de cozinha posição de destaque cultural, associada a glamour, reconhecimento e ascensão social. Essa visibilidade, embora tenha contribuído para a valorização simbólica da profissão, também produziu um imaginário que nem sempre corresponde à realidade concreta do mercado de trabalho, caracterizado por alta rotatividade, longas jornadas e significativa informalidade.

Paralelamente, a expansão da formação acadêmica e técnica reflete a consolidação da gastronomia como campo de conhecimento. Segundo dados do Ministério da Educação (2025), existem cerca de 1.220 cursos na área, distribuídos entre tecnólogos, bacharelados, especializações e formações profissionalizantes. Essa oferta ampliada representa oportunidade de qualificação, mas também evidencia contradições: enquanto parte dos cursos atende a padrões de excelência, outros possuem caráter meramente instrumental, alimentando expectativas desproporcionais em relação ao mercado. A heterogeneidade, somada ao prestígio midiático, reforça a dicotomia entre o “chef-celebridade” e a realidade cotidiana da maioria dos trabalhadores.

Nesse cenário, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) desempenha papel estratégico como entidade representativa do setor de alimentação fora do lar, ao articular empresários, poder público e sociedade. Sua atuação tem sido fundamental na defesa de políticas públicas, na promoção da qualificação e na busca por maior sustentabilidade econômica dos empreendimentos. No entanto, o alcance dessas ações enfrenta limitações diante dos desafios estruturais do país, como a informalidade persistente, as baixas margens de lucro e as dificuldades em garantir condições laborais dignas.

Assim, a valorização do profissional da gastronomia revela-se fenômeno simultaneamente simbólico e estrutural: de um lado, a mídia amplia o prestígio da profissão; de outro, a formação busca suprir demandas de um mercado em expansão, enquanto a Abrasel atua como mediadora institucional. A inter-relação desses fatores, entretanto, evidencia tensões que desafiam a consolidação plena da gastronomia como campo profissional.

O futuro da área não depende apenas do brilho das telas ou da proliferação de cursos, mas da capacidade de alinhar prestígio, formação qualificada e representatividade institucional. O desafio está em transformar a visibilidade conquistada em reconhecimento efetivo, com melhores condições de trabalho, inclusão social e valorização concreta da mão de obra. Se bem articulados, mídia, educação e entidades representativas podem consolidar a gastronomia como um dos setores mais dinâmicos e transformadores da economia brasileira — capaz de gerar emprego, fortalecer a cultura e projetar identidade para além das cozinhas.

* Chef de cozinha,  professora de confeitaria e gastronomia, dona do Maria José Buffet

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