Irlan MeloAdvogado, teólogo, professor universitário e vereador de BH eleito para seu segundo mandato como o 8° vereador mais votado de BH

Quando o adversário vira inimigo

Publicado em 22/09/2025 às 06:00.


Tenho acompanhado, com muita preocupação, o caminho que a política brasileira vem tomando. Primeiro te chamam de “extrema-direita”. Depois, de “fascista”, “golpista”. E assim, devagar, você deixa de ser uma pessoa comum para se transformar em um monstro inventado. Um inimigo a ser eliminado.

Esse roteiro não é novo. A história mostra como regimes autoritários começaram exatamente assim: desumanizando seus opositores. Hitler, por exemplo, nomeou seu advogado de confiança, Franz Gürtner, como ministro da Justiça. A partir dali a lei deixou de ser instrumento de justiça e virou arma para perseguir e esmagar quem discordava do regime. Tudo “legalizado”.

E não precisamos ir tão longe no tempo para perceber os paralelos. Aqui no Brasil, também vimos presidentes nomeando advogados pessoais para o Supremo Tribunal Federal. Lula fez isso duas vezes: primeiro, em 2009, com Dias Toffoli; mais recentemente, com Cristiano Zanin, que foi seu defensor na Lava Jato. A questão não é apenas se isso é permitido. O ponto central é: até onde vai a independência da Justiça quando a cadeira mais alta do Judiciário se confunde com o escritório de advocacia do presidente?

Mas o problema não para aí. Quem ousa levantar essa discussão logo recebe o carimbo de “radical”, “bolsonarista”, “golpista”. E pronto: já não é mais cidadão, mas inimigo. E contra o inimigo, tudo passa a ser permitido: silenciar, perseguir, cancelar. É a escalada perigosa que começa nas palavras e termina em tragédias.

É isso que me assusta. Primeiro vem a rotulação. Depois, a desumanização. Por fim, aplaudem a sua queda seja política, moral ou até física. E não se enganem: esse processo não destrói apenas indivíduos, mas corrói toda a sociedade.

A política não precisa ser assim. A democracia se fortalece no contraditório, na divergência, no debate transparente. Nomear alguém de confiança pode ser legal, mas precisa ser acompanhado de critérios claros, de escrutínio público e de respeito à independência das instituições. Criticar deve ser um ato democrático, não uma sentença de exclusão.

Quando rotulamos o outro como inimigo, abrimos mão de discutir ideias para atacar pessoas. E quando a gente perde a capacidade de enxergar o próximo como gente, o que resta é o terreno pronto para injustiças e abusos.

Se quisermos preservar nossa liberdade, precisamos rejeitar essa lógica de demonizar o adversário. O Brasil precisa de debate, não de caça às bruxas. De política transparente, não de rótulos que desumanizam. Porque, no fim das contas, quem perde não é apenas quem carrega o estigma. Perdemos todos nós.

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